A série brasileira ‘Cidade Invisível’ da Netflix

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Por André Luiz Dos Reis – Acabei de assistir à série brasileira “Cidade Invisível”, criada por Carlos Saldanha e dirigida por Júlia Pacheco Jordão e Luís Carone. A série está bombando na Netflix e derretendo tanto o público quanto o coração dos gringos. Com certeza vai ganhar uma segunda temporada.

Bom, é pra isso tudo?

Sim e não.

Vamos ao lado positivo. Há um esforço consciente e louvável de reapresentar às novas gerações de brasileiros e para os estrangeiros, entidades e encantados diversos do rico folclore pátrio. Carlos Saldanha estudou o assunto, compilou centenas de mitos, e pretende aproveitar tudo o que puder na medida em que a série evoluir.

A reapresentação é também uma ”repaginação”, ou reinvenção, das lendas. As figuras são modernizadas, nem sempre para melhor. Nessa primeira temporada, aparecem a Cuca, Tutu Marambá, o Boto, a Iara, o Curupira, o Saci, o Corpo Seco. Só que faltou mergulhar nas histórias da cultura popular. Foi tudo rápido e jogado, embora houvesse espaço pra mais detalhes.

Além do tempo exíguo de cada episódio, um dos principais obstáculos pra uma abordagem mais rica é a ambientação da história exclusivamente no Rio de Janeiro. Certamente isso ajuda a vender a série para fora do país, e o Rio é de fato um município com ambientes variados, que incluem florestas, mangues e comunidades tradicionais.

No entanto, por mais que a produção explore com sucesso a magnificência visual carioca, há limites quando se trata de retratar encantados tão vinculados a modos de existência específicos. Uma segunda temporada, com mais grana, tem de se aventurar por outras paragens pátrias. Eu não imagino a Mula Sem Cabeça, por exemplo, confinada à Lapa, a Guaratiba ou a uma cidade apenas do país, isso seria trair a essência mesma do mito.

As críticas sociais na transposição das entidades para o cenário urbano foram bem feitas, bem como o tom ambientalista em torno da preservação da Vila Toré, comunidade tradicional de pescadores da ”Floresta do Cedro”, que estaria localizada na zona oeste da cidade, lá pela área de Campo Grande e Guaratiba. Uma construtora disputa com os moradores a propriedade da área, com o discurso de que seu empreendimento estaria mais apto para proteger a mata. A Vila, no entanto, defende também a manutenção de seu estilo de vida e costumes.

O tom pretende ser adulto, então não há de se esperar um tratamento lúdico dos seres sobrenaturais que andam por essa ”Cidade Invisível”. Mas o laço com as crianças está presente pelo olhar da filha do policial Eric, o protagonista da série.

Há defeitos gritantes, porém. A maioria dos personagens é mal desenvolvida, a direção de atores é fraca, as atuações sofríveis, com a exceção do excelente Fábio Lago, que vive Iberê/Curupira. O enredo se desenvolve com alguma lentidão e aos tropeços. O texto é superficial, repetitivo e pouco imaginativo. Isso reforça a minha reclamação anterior, a de que as lendas deveriam ter sido melhor exploradas, já que a história principal poderia ser condensada em três episódios de meia hora, em vez de sete.

A reconstrução das entidades tem um ponto cego que me incomodou sobremaneira, a ideia de que eles podem ”morrer”, um completo nonsense pra quem entende o que é um encantado. Alguém precisa puxar seriamente a orelha do Carlos Saldanha nisso daí.

A série até segura o mistério policial que é o fio condutor da história. Mas, em muitos e muitos momentos, os episódios pediam, clamavam, exigiam uma boa dose de terror, que nos foi negada. Esse é outro elemento que tem de ser alterado nas temporadas seguintes.

A produção é bacana, e o tratamento visual do Curupira é belo e moral. Não sei se posso dizer isso de todas as entidades, porém, e fica sempre aquele sabor de ”Globo Filmes” na cenografia.

Enfim, os gringos estão deliciados, mas nós brasileiros podemos exigir mais e melhor. A primeira temporada ganha uma nota 5,5 pelo conjunto. Mas o potencial é enorme, e a iniciativa tem de ser incentivada.

Por André Luiz Dos Reis

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