A culpa e a não-culpa de Marx

Marx, no livro I do Capital, realizou uma análise do modo de produção capitalista em altíssimo nível de abstração buscando apreender as leis tendenciais mais gerais, mais "puras" (termo ruim) e determinadas do modo de produção burguês. Não é uma análise sobre a Inglaterra. Marx, quando cita a Inglaterra, é apenas a título de ilustração da tese a ser demostrada.
Botão Siga o Disparada no Google News

Marx, no livro I do Capital, realizou uma análise do modo de produção capitalista em altíssimo nível de abstração buscando apreender as leis tendenciais mais gerais, mais “puras” (termo ruim) e determinadas do modo de produção burguês. Não é uma análise sobre a Inglaterra. Marx, quando cita a Inglaterra, é apenas a título de ilustração da tese a ser demostrada.

Aliado a isso, dentro desse quadro de altíssimo nível de abstração, e ligado a condicionantes políticos do período, Marx realiza certos expedientes teóricos. Por exemplo, quando vai falar da extração de mais-valor ele toma como um pressuposto que os trabalhadores recebem de acordo com o valor histórico-moral da força de trabalho. Marx faz isso para provar que a palavra de ordem “salário igual” ou “todo produto do trabalho” não faz sentido, mas Marx sabia que os trabalhadores/as receberem de acordo com o valor histórico-moral da sua força de trabalho (em termos integrais) é um pressuposto dificilmente encontrável na história.

Em resumo, no Livro I, na prática, não existe a categoria de formação econômico-social. O capítulo sobre a acumulação primitiva de capital, por exemplo, é que trabalha em um nível de abstração menor e concretude maior que a obra como um todo.

Marx, contudo, sabia que estava trabalhando nesse nível de abstração. Ele até falou isso de forma sútil no prefácio. O problema é que foi sútil demais.

Não poucos marxistas pegam as categorias do Capital Livro I e tentam aplicar na análise de uma formação econômico-social.

Ignoram mediações, historicidade, diferenças no nível de abstração, substrato político da expressão categorial e mais um monte de coisas.

O resultado? Ficar procurando no Livro I a resposta para, por exemplo, a questão da indústria no Brasil ou a lei do valor na China.

Procedimento errado. Primariamente errado. É uma espécie de outro lado da moeda do mecanicismo anti-dialético. É o abstracionismo pseudo-dialético.

E mais grave ainda. Diria que a imensa maioria dos marxistas quando vão pensar teoria da transição socialista, cometem esse erro.

Massa seria fazer a “volta à Marx” e pedir para ele escrever uma carta psicografada explicando que não se apreende o concreto como síntese de múltiplas determinações buscando-o em categorias trans-históricas de altíssimo nível de abstração…

Falhou, camarada Carlinhos…