Uma das coisas mais bacanas da cerimônia de abertura dos Jogos Pan-Americanos de Lima, no Peru, foi perceber o quanto eles valorizam os traços de continuidade com a cultura nativa.
No fim da festa, a tocha do evento estava acesa no alto de uma “montanha” figurativa, em um símbolo solar quéchua. Belo e Moral. Mais do que isso, irretocável.
Já aqui entre nós, cismam que nossa civilização nada tem de indígena, a não ser elementos esparsos, insignificantes, de relevância menor.
A gente atura um parlamentar qualquer do Rio dizer que “quem gosta de índio, que vá pra Bolívia”, uma declaração burra, que esquece que a cidade foi fundada em meio a uma guerra cuja vitória dependeu da coragem de povos tupis. E que as margens do Rio “Carioca”, que parte do Cosme Velho e de Laranjeiras e deságua na Baía de Guanabara, já era habitada quando os primeiros europeus colocaram o pé por aqui.
O Brasil continua com aquele desejo inconsciente de se tornar uma neo-Europa, o que significa, no fim das contas, permanecer à margem do Ocidente, dependente econômica e culturalmente, e de costas para nosso próprio continente.
Para mergulhar no sertão, o país tem de descobrir as raízes que o ligam à terra, as raízes que o indianizam, e lhe permitem se ver nos povos ao seu redor. Essa é a única forma de interiorização aceitável, já que a outra, aquela realizada pelos anglo-saxões no Norte, não passa de terra arrasada, um modo de arrancar tudo o que é vivo da região para realizar um experimento “original” e monstruoso.
Nenhuma interiorização será possível enquanto não acreditarmos de verdade que a América é o centro do mundo. E que para participarmos dela, temos de prestar reverência e culto aos seus deuses.
Por André Luiz dos Reis.