JONES MANOEL: O ecologismo branco de Luísa Mel

JONES MANOEL: O ecologismo branco de Luísa Mel
Reprodução/Instagram/luisamell
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Uma pequena nota sobre racismo e a carne mais barata do mercado.

Bem, dias atrás eu publiquei um Twitter que dizia o seguinte:

“Sobre Luisa Mell, não tem mistério. Domenico Losurdo já resumiu

‘É estranho um certo ecologismo que se preocupa com todas as vidas, menos com a dos seres humanos’.

É isso. Ecologismo burguês, branco, racista e descolado da realidade”

O twitter viralizou e muita gente veio me atacar. Destaco, no geral, duas críticas: a) não existe hierarquização de pautas. A vida dos animais é tão importante quanto a do ser humano; b) Luisa Mell faz um importante trabalho em defesa dos animais e eu estou desprezando todo seu trabalho.

Duas coisas.

Primeiro, a afirmação a) é falsa. Sim, existe uma hierarquização. A vida de todos os seres humanos, na prática, não tem igual valor. Matar um negro não tem o mesmo impacto social, simbólico, político, institucional, cultural e ideológico que matar um branco. É mais fácil se comover com a morte de um cachorro bonitinho do que com a de um jovem negro. Basta afirmar que um jovem negro morto era “envolvido com o tráfico” e seu assassinato fica plenamente legitimado.

Eu já disse e repito: não acho que o genocídio da população negra é uma palavra de ordem. Considero que é uma caracterização sociológica PRECISA que DESCREVE um complexo processo de extermínio, a partir de aparelhos públicos e privados (oficial e oficioso), de mais de 40 mil pessoas negras todos os anos assassinadas. É possível, sem muitos problemas, fuzilar crianças negras toda semana no Rio de Janeiro sem um governo viver uma crise política por causa disso.

A despeito de existir um genocídio da população negra, e uma centralidade da questão racial na Revolução Brasileira e na luta de classes, a luta antirracista não é central para a maioria das organizações, intelectuais e parlamentares da esquerda.

Então sim, na configuração social brasileira, é possível e acontece com certa constância, um animal doméstico ter sua vida com mais valor socialmente reconhecido que um negro.

Segunda coisa, dizer que a figura em questão defende um ecologismo burguês e que muitas vezes é racista não é o mesmo que dizer “olha, ela nunca fez nada que preste”. Por exemplo, não tenho qualquer simpatia pela militância do Greenpeace. Creio que em última instância eles são um braço do imperialismo e tem uma visão burguesa de defesa do meio ambiente. Isso não significa, porém, que eles nunca fizeram nada que preste ou que nunca salvaram animais ou até evitaram tragédias ambientais. Eu não tenho culpa se vocês pensam de forma positivista. Eu não penso assim.

Terceiro, e última: existe hoje, em nosso país, uma força crescente do fundamentalismo religioso que toma como principal inimigo as religiões de matriz africana. Pior: se expressa com cada vez mais força o fenômeno dos “traficantes evangélicos” que em conluio com pastores ataquem e destroem terreiros e locais sagrados das religiões de matriz africana.

Numa situação como essa, onde o extermínio da população negra é intensificado no quadro geral de endurecimento do regime burguês, e expressões culturais associadas a essa população, como as religiões de matriz africana, são cada vez mais criminalizadas, perseguidas, vilipendiadas, colocar os “sacrifícios de animais” das religiões de matriz africana como o grande inimigo dos animais é racismo e desprezar sim a vida humana.

Quer salvar os animais? Ataque a propriedade privada da terra, o latifúndio mono produtor, o agronegócio e o caráter primário-dependente da economia brasileira.

E racismo, mesmo quando não se é consciente dele, continua sendo racismo.

Fogo nos racistas!