Morre Francisco de Oliveira

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Infelizmente, morreu Francisco de Oliveira, o único dialético de velha cepa da USP-CEBRAP, os meus primeiros heróis intelectuais que, por assim dizer, ao pensar de maneira heterodoxa, dentro da tradição marxista, o Estado de Bem Estar Social, me ajudou a chegar a Franz Neumann e me arriscar a pensar o direito como emancipação com o seu controverso “Os Direitos do Anti-Valor”. Ruy Fausto fez um movimento claro na direção da heterodoxia marxista muito tempo depois.

Por isso mesmo, tive que negar com certa veemência essa tradição para me tornar quem eu sou – com a exceção da obra de Francisco de Oliveira, que me acompanhou de perto neste movimento -, mas sempre mantendo o que me parece essencial, o horizonte aberto por um pensamento situado na periferia do capitalismo.

Para quem prestar atenção, a minha visão do Direito resulta da leitura, via Roberto Schwartz, de um autor marginal e esquecido, figura escanteado de uma escola critica do centro capitalista, Franz Neumann, com a finalidade de, por assim dizer, mostrar que o “favor“, na minha nomenclatura, uma das figuras da perversão do direito, deve ser pensado como antecessor de novas figuras, adequadas para explicitar a dominação como praticada nos dias de hoje.

Pois o direito segue sendo protagonista de operações semelhantes, operações que sabotam a realização da autonomia prometida pela ideologia liberal, mas sem nega-la de frente, mantendo sempre as aparências.

No entanto, agora, por aqui, em outro contexto, tudo passa a ser feito a partir de outros pressupostos e não mais com o pano da escravidão. De sua parte, no centro capitalista, as mesmas forças que, um dia, tiveram que negar abertamente o direito liberal para manter o capitalismo em funcionamento, criando regimes autoritários, hoje se valem também da forma esquiva de novas figuras da perversão do direito.

Apesar de não ter sido seu aluno e não ter tido convivência alguma com ele, sou muito grato a Francisco de Oliveira pelos textos que escreveu ao longo desses anos, especialmente pelo citado “Os Direitos do Anti-Valor”, livro importante para atestar a minha sanidade, eu, em certo momento da minha vida, completamente isolado na Faculdade de Direito, sem referências intelectuais na família ou entre os mais próximos, buscando subsídios para refletir sobre o direito nas ciências humanas e nas escolas críticas do direito de então é só encontrando pensamento ortodoxo, direito como superestrutura, direito como instrumento de pura dominação.

Obrigado Professor Francisco de Oliveira por me fazer companhia em um momento de tanta insegurança em minha trajetória intelectual. E meus pêsames para todas as pessoas que efetivamente privaram de sua convivência e amizade.

Por José Rodrigo Rodriguez, Professor da UNISINOS e Pesquisador do CEBRAP