A recriação genial dos X-Men por Jonathan Hickman

A recriação genial dos X-Men por Jonathan Hickman
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Por Antônio Cazarine – A vida dos humanos tem sido inglória em sua maioria nos últimos tempos, mas um grupo em especial recebeu esse ano catastrófico de 2020 com uma cobertura um pouco mais doce que a da maioria. Os fãs de X-Men vem sendo levados à pão de ló com sagas acima da média, primeiro por Ed Piskor e seu Grand Design e agora com o divisor de águas aguardadíssimo que é a serie dos mutantes feita por Jonathan Hickman.

O trabalho hercúleo de Hickman para colocar os X-Men novamente no primeiro escalão vem no movimento da compra da Fox pela Disney e a consequente integração dos mutantes ao MCU. Brian Bendis, antigo roteirista da série, passou a batuta com certo sucesso conquistado em suas sagas, Dinastia M e X-Men versus Vingadores, que integraram bem a equipe mutante ao restante dos heróis da Marvel, indo contra ao costume de mantê-los afastados em seu próprio universo, mantido mesmo durante as grandes sagas de Chris Claremont nos anos 90. A ideia do roteirista foi trazer o caráter da ficção cientifica que sempre permeou suas obras (vide Quarteto Fantástico, Vingadores, Projeto Manhattan e East of West) para a equipe, e para isso retomou a tradição isolacionista mutante. A euforia promovida pelos editores do titulo, C.B. Cebulski e Jordan D. White, para a volta de Hickman à Marvel não foi nem um pouco exagerada.

A missão árdua de trazer a equipe X para a “Classe A” dos heróis foi cumprida com um vigor estonteante e juntamente com outra, considerada impossível, e que nem estava na encomenda: simplificar os títulos mutantes. Os X-Men sempre foram um emaranhado de títulos e equipes que conversavam entre e si e praticamente impossíveis de serem acompanhados em banca, isso acabou. Hickman estabelece dois títulos: “Dinastia X” e “Potências de X”, que saem intercaladas na gringa, mas acertadamente são compiladas em arcos pela Panini no Brasil em 4 encadernadinhos de capa mole super caprichados (detalhe para a primeira edição que vem com um papel-semente, referência aos portais que dão acesso ao território krakoano). Esses primeiros 12 números são o começo desse novo universo com uma apresentação excepcional firmada em conceitos de construção destruidora, sendo personagem central da fase o Professor X.

Criado nos anos 60 por Stan Lee e Jack Kirby em cima de Martin Luther King e seu discurso pacifista e não separatista, Charles Xavier assume uma postura muito mais próxima da linha de Magneto, sendo bem mais impetuoso e diplomático. Pegando para si a missão de fundar uma nação mutante na ilha de Krakoa (um conceito de ilha viva) que tenha reconhecimento de soberania como país pelos outros Estados, e em troca desse reconhecimento oferece às nações amigas uma medicina única de Krakoa; remédios que curam todas as doenças mentais humanas, prolongam a vida em 5 anos e antibióticos universais e mutáveis. O mundo ou reconhece a nação ou ataca e tenta roubar esses fármacos, qual vai ser a escolha? Aqui entra o novo lado pulso firme do Professor X com atitudes que dizem, em termos claros: -“eu não estou dando uma opção, estou dizendo o que vai ser feito. Aceitem e vai ser melhor”. Pra esse projeto de país mutante dar certo os inimigos da mesma raça acabam para Charles Xavier, que fornece anistia à todos os mutantes criminosos que queiram ajudar a forjar o país, como Dentes-de-sabre, Mística e Apocalipse. A questão de como acontece a estruturação do Estado nascente é também bem desenvolvida e interessantíssima pois os antigos inimigos ocupam cargos decisórios no governo de Krakoa.

Hickman superou também o problema da cronologia confusa dos X-Men, dificílima de acompanhar até para os fãs mais assíduos, criando dois conceitos inéditos: um focado em Moira Mctaggert, de uma sagacidade impensável; e o outro relacionado à clonagem, ressureição e linhas do tempo, muito bem explicado e aplicado. Entre as histórias várias intervenções textuais profundas são feitas para explicar esses sensacionais conceitos. Um dos mais bacanas desses conceitos é a forma que o argumentista aborda a diferença dos mutantes e humanos no enfrentamento de questões e dilemas da vida social, afinal eles são outra raça, o homo superior.

É difícil achar um quadrinho em banca de tamanha qualidade, tão bem escrito, com tantas nuances que te levam à reflexão ao mesmo tempo em que te divertem, e o mais incrível, com tão poucos números! Você até se perde na leitura, tamanha a maestria do autor, que segue em alta para te guiar para todas as respostas para essas grandes questões plantadas. Com certeza vale ser acompanhada até o remate final.

Por Antônio Cazarine