Sobre Stálin: de Mao para Kruchev

Demorei a compreender a natureza do debate sobre a figura de Stálin. É tão surreal a tentativa de enquadrar em rótulos personagens que pertencem à história que é difícil acreditar na controvérsia.

Você acredita em heróis? Em ídolos perfeitos? Em ícones históricos infalíveis? Não fale isso por aí, vão perceber que você não sabe nada sobre eles. A história é mestre em liquidar mitos. Não há registro de luta pelo poder “limpinha”.

Na feroz luta de classes esse papo de mocinho e bandido é conto da carochinha. Os vencedores escreveram a história de forma brutal.

O que dizer dos espanhóis que colonizaram boa parte da América Latina exterminando as civilizações originárias? Incas, Maias e Astecas foram dizimados. Europeus “culturalmente superiores” fizeram isso?

Tem luta pelo poder? Destas que mudam o curso dos acontecimentos? Não tem moleza nem quando se trata do mesmo povo. Na Guerra de Secessão, estima-se que morreram 970 mil norte-americanos.

Os EUA e os países europeus patrocinaram todo tipo de genocídio pelo mundo. Hiroshima e Nagazaki estão aí para tirar qualquer dúvida. Os imperialistas repartiram a África entre eles no pós-guerra como quem corta um queijo suíço. Saque e extermínio como política de estado, “sob as bênçãos da sacrossanta” Nações Unidas.

Isso absolve os responsáveis pela morte de dezenas de milhões de fome na China no “Grande Salto Adiante” e nas perseguições sectárias da “Revolução Cultural” de Mao? Claro que não. Reconhecer estes fatos reduz o papel histórico de Zedong como líder indispensável na Revolução e na afirmação do Império do Meio? Também não.

Stálin faz parte da galeria onde estão Churchill, Roosevelt, Mao, Ho Chi Minh, de Gaulle e alguns outros personagens marcantes do século XX. Não tem bonzinho no meio desta turma. Mas dá pra saber sem muito esforço o lado de cada um na luta de classes. Você está de algum lado, mesmo que não queira ou não saiba.

O georgiano cometeu muitos erros e acertos. Quem possui uma balança para medir o saldo? Cometeu expurgos e assassinatos em massa? Sim. Foi decisivo para derrotar Hitler e impedir que este texto estivesse em alemão? Não há dúvida. Sem o vigor da experiência soviética haveria Estado de Bem-Estar Social na Europa? Não.

Sua liderança foi inquestionável. Tratá-lo como um sociopata é ignorância histórica ou opção ideológica. Assombrado pelo suposto testamento de Lênin – não há comprovação histórica da veracidade dos ditados -, Stálin entregou três vezes o cargo de secretário-geral do partido. O Comitê Central recusou sua renúncia três vezes.

A Rússia foi uma monarquia autocrática durante mil anos. Só os Romanov governaram por 300 anos. Saiu Nicolau, entrou Koba. Putin está por aí, “muito bem, obrigado”. É curiosa a prepotência dos ocidentais. Acham que podem medir o mundo pela régua de suas culturas.

Sobre Stálin, tem uma passagem que gosto muito. Certa vez, num encontro com Kruchev, Mao fez questão de expor sua opinião sobre Josef: “As mãos têm dez dedos. Stálin acertou em sete”. Os caras têm cinco mil anos, devem saber alguma coisa.

Stalinista, eu? Sai pra lá, rótulo pra cima de mim, não! Sou um cidadão do mundo devoto da Vila Isabel, Tricolor e Comunista.

Sair da versão mobile