O que o Brasil ganha entrando na OCDE?

Muitos se deliciarão com a notícias de que "agora o Brasil faz parte do clube dos ricos". Os países periféricos perderão, com isso, um líder natural. Unidos com os nossos iguais, teríamos mais força para contestar as estruturas globais de poder que barram a defesa da nossa soberania e fomentam a entrega dos nossos recursos.
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Em conferência da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), na última quinta feira, ocorrida em Paris, os EUA declararam apoio oficial à entrada do Brasil no órgão internacional.

Durante o encontro entre Bolsonaro e Trump em Washington, realizado em março, o presidente norte-americano já havia se comprometido com o Brasil nessa questão. Obviamente a integração do Brasil ao grupo não seria gratuita.

Em troca, o Brasil deveria abrir mão do tratamento especial na Organização Mundial do Comércio (OMC), do qual resulta que países periféricos possam usufruir de uma série de vantagens comerciais.

Os defensores da entrada do Brasil na OCDE argumentam que, por ser considerada um “clube” de países ricos, isso traria uma série de outros benefícios econômicos. Por exemplo, a confiança dos investidores estrangeiros aumentaria com o “selo de investimento” da instituição.

Essa visão, contudo, não corrobora pesquisas e estatísticas de investimentos estrangeiros. Os observadores mais atentos e menos expostos à intoxicação ideológica cosmopolita sabem que fatores como o tamanho do mercado, a presença de recursos naturais, infraestrutura, recursos humanos qualificados e o preço da mão de obra são muito mais determinantes para a atração de investimentos do que a confiança subjetiva de agentes investidores no mero pertencimento institucional de qualquer país a uma instituição multilateral.

O relatório anual sobre investimentos internacionais da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) publicado em 2018, mostra que em 2016 e 2017, a China, que não faz parte da OCDE, foi o 3º maior receptor de investimento estrangeiro direto (IED) no mundo, seguida de sua região administrativa Hong Kong, que tampouco integra os quadros da OCDE.

O Brasil, em 7º no ranking, apesar de receber mais IED que vários países da OCDE como França, Holanda, Austrália, Alemanha e Canadá, possui uma economia incomparavelmente menos dinâmica e desenvolvida do que as desses países. Isso significa que a atração de investimentos, em si, não se traduz de modo algum em desenvolvimento econômico.

Apesar disso, a entrada na OCDE pode implicar em uma série de custos para o Brasil. Além de abandonar gratuitamente vantagens comerciais na OMC, a OCDE cobra contribuições financeiras de seus membros.

Outro argumento de seus defensores é que os integrantes da OCDE podem usufruir do debate interno da instituição, que consta com a participação dos países mais desenvolvidos do mundo, sobre políticas econômicas e políticas públicas.

Deduz-se disso que a grande maioria dos portadores dessa bandeira são ignorantes a respeito da vasta literatura econômica a respeito das especificidades do (sub)desenvolvimento brasileiro, que impede o sucesso de simples transplantes de soluções econômicas e institucionais copiadas de outros países.

Nossa formação econômica é diferente. Como lembra Celso Furtado, o subdesenvolvimento nunca foi uma etapa pela qual todos os países desenvolvidos tiveram que passar para chegar ao patamar de desenvolvimento que atingiram. O subdesenvolvimento é um fenômeno histórico, que significa ocupar uma posição subalterna na divisão internacional do trabalho.

Os países desenvolvidos exportam tecnologia, enquanto os países subdesenvolvidos consomem essa tecnologia produzida lá fora. A China, aliás, trabalha arduamente há décadas para furar essa bolha, mas seguindo sua própria receita.

Os debates internos da OCDE, portanto, dizem respeito a políticas públicas e econômicas voltadas para essas realidades que não se confundem com a realidade econômica e institucional de um país como o Brasil. Fazendo parte da OCDE, estaríamos pagando e abrindo mão de vantagens para ter acesso a algo que não nos diz nada.

O que esperar, no entanto, de um governo que desde que assumiu preocupa-se mais em entregar todos os nossos instrumentos de soberania do que implementar qualquer plano para sair da crise?

Muitos se deliciarão com a notícias de que “agora o Brasil faz parte do clube dos ricos”. Os países periféricos perderão, com isso, um líder natural. Unidos com os nossos iguais, teríamos mais força para contestar as estruturas globais de poder que barram a defesa da nossa soberania e fomentam a entrega dos nossos recursos.

Divide et impera, disse o imperador romano. Dividir para conquistar.