Um Projeto Nacional de Desenvolvimento: o New Deal brasileiro

Partindo dessa ideia, o New Deal do século XXI traz como dogma uma espécie de produtivismo includente, por meio de uma revolução na geração de conhecimento por intermédio de uma educação pública de qualidade, um sistema bancário estatizado e um Estado Empreendedor
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Um dos grandes desafios para uma nação em desenvolvimento é o de trilhar um caminho que reverta processos antigos de inserção subordinada na economia mundial, e assim construir sua própria história. Alguns autores como Celso Furtado, John Kenneth Galbraith, Ha-Joon Chang e Mariana Mazzucato argumentam que apenas o movimento das livres forças de mercado não é capaz de levar economias capitalistas (em vias de desenvolvimento) ao desenvolvimento. É necessário, num país como o Brasil, uma projeto que alie crescimento e geração de emprego com distribuição de renda e a atenuação das disparidades regionais. Portanto, estes são objetivos de uma nação em prol do bem-estar coletivo. Esse caminho é possível por meio de um conjunto de políticas públicas que articulam virtuosamente os diversos agentes sociais em torno de um projeto de desenvolvimento nacional sustentável e que seja inclusivo. A literatura econômica mostra que a maioria das experiências exitosas de desenvolvimento teve como papel fundamental o Estado como ator estratégico nos processos nacionais de construção política, econômica e social.

Se por um lado, com os novos paradigmas tecnológicos no contexto da globalização financeira e da informação estão trazendo fortes modificações ao mundo atual, em que a inovação tecnológica está cada vez mais presente como motora do desenvolvimento das economias. Por outro lado, uma nação deveria ter como um dos seus objetivos primordiais a construção de uma política de pleno emprego centrada na capacidade de intervenção estatal na economia e da regulação pública do mercado de trabalho.

É nesse contexto que se procura evidenciar a importância de um Estado Empreendedor como o principal instrumento para fomentar a adoção de novas tecnologias, gerando com isso um ambiente mais competitivo. Há duas perspectivas apresentadas aqui. A primeira, a experiência brasileira em planejamento econômico a partir de 1930, percorrendo os governos desenvolvimentistas até a década de 1980 e a frágil tentativa de retomar esse processo a partir de 2006. A segunda, é a experiência do New Deal na economia norte-americana durante os governos de Franklin Roosevelt.

Diante do exposto, o objetivo geral desse artigo pode ser expresso com a seguinte pergunta: cabe ao Estado ser o motor do desenvolvimento econômico brasileiro? Muito se debate, atualmente, sobre o papel do Estado. Desde uns mais radicais que pregam um estado mínimo, desde outros que salientam que o estado deve participar de atividades econômicas. Nesse artigo adota-se a perspectiva que o Estado é o principal agente a promover o crescimento e desenvolvimento socioeconômico.

O desenvolvimento tem dois conjuntos de metas, às vezes antagônicas. O primeiro destaca a integração nacional, o prestígio do país no exterior, a estabilidade econômica e o crescimento econômico; o segundo corresponde à qualidade de vida da população, por meio da distribuição de renda e da satisfação das necessidades básicas em matéria de saúde, alimentação, habitação, educação e emprego, além da garantia dos direitos individuais, de dignidade, e liberdade de pensamento.

O Estado, com o objetivo de atingir essas duas metas, além das suas três funções clássicas: distributiva, alocativa e reguladora – deve atuar como articulador e fomentador da inovação tecnológica e na manutenção do pleno emprego; vitais na era do conhecimento para o desenvolvimento econômico. Portanto, além de criar um ambiente propicio a investimentos privados, caberia ao estado ter como meta à preservação do pleno emprego e a manutenção do crescimento econômico. Conforme Galbraith, “na economia moderna a produção é agora mais necessária pelos empregos que oferece do que pelos bens e serviços que proporciona”. Por isso, os Estado-Nacionais, principalmente em países subdesenvolvidos ou em vias de desenvolvimento, devem sair do debate entre estado máximo ou mínimo, e sim, um estado forte (com plenas condições de intervir na economia por meio de um planejamento consistente e de longo prazo) e necessário (para promover qualidade de vida para sua população).

Procurando contribuir na atualização do conceito de um New Deal do século XXI para o Brasil, e inspirado nas idéias de Mazzucato, Galbraith, Mangabeira e Chang, procurou-se mostrar a necessidade de um projeto nacional de desenvolvimento que tenha como prioridade aliar plano emprego com inovação tecnológica por meio de um Estado empreendedor. Desse modo o desenvolvimento socioeconômico seria atingido por meio de ação indutora do Estado em paralelo ao fortalecimento do trabalho sobre o capital (sempre tendo em vista a convivência harmônica por meio da superação democraticamente das diferenças de classe) e do trabalho produtivo frente ao rentismo, por meio de uma melhor distribuição da renda e da riqueza objetivando promover progresso, desenvolvimento, igualdade e justiça social.

Partindo dessa ideia, o New Deal do século XXI traz como dogma uma espécie de produtivismo includente, por meio de uma revolução na geração de conhecimento por intermédio de uma educação pública de qualidade, um sistema bancário estatizado e um Estado Empreendedor. Esses três elementos seriam o fomentador de um ambiente econômico inovador que alimentaria todo um tecido de empresas privadas e jovens empreendedores. Esse artigo busca apontar que o caminho para um projeto nacional-desenvolvimentista em uma economia com o capital e a informação globalizados é por meio de um Estado empreendedor que promova a ação empreendedora e inovadora dos agentes econômicos nacionais (principalmente as pequenas e médias empresas), visto que as grandes (cuja maioria são multinacionais estrangeiras) já estão entrelaçadas com cadeias de produção e de desenvolvimento de P&D globais, e que inibem a transferência de tecnologia. Ademais, a educação sendo totalmente pública e de qualidade visaria resolver o problema da baixa produtividade da nossa economia elevando a qualidade de vida dos nossos trabalhadores e igualando as oportunidades, ou seja uma verdadeira meritocracia.

Nesse sentido que um novo New Deal serviria para retomar a capacidade do investimento do Estado e fortalecer o poder estratégico para a construção de um novo projeto nacional de desenvolvimento. Desse modo, seria um erro apostar no setor privado como o gatilho do desenvolvimento. Fazendo uma analogia, o Estado seria a locomotiva e o setor privado os vagões nos trilhos do desenvolvimento. Não basta regular a economia de mercado, não basta atenuar as desigualdades geradas no mercado por políticas compensatórias de redistribuição. É preciso democratizar o mercado no seu conteúdo institucional, para ampliar as oportunidades econômicas e educativas, e, portanto, para dar braços, asas e olhos a este dinamismo humano que fervilha frustrado no nosso país: os pequenos e médios empresários. Conforme defende Mangabeira (2015), um novo projeto nacional seria, portanto, um projeto produtivista e capacitador, e não é um nacional-consumismo. É um produtivismo includente acompanhado por uma revolução na educação pública que permita uma consciência das massas aliado ao vanguardismo tecnológico e organizacional pelas empresas.

Portanto, existe a necessidade de reformas estruturais que sirvam de base para o desenvolvimento do país. Podemos apontar algumas dessas reformas necessárias para um projeto de nação como: o fim do oligopólio dos meios de comunicação (que atualmente domina e manipula a informação e combate uma ideologia nacional de desenvolvimento), uma reforma tributária com viés progressivo, uma reforma política (que amplie a participação popular e fortaleça as ideologias partidárias), e uma revolução na educação que traga uma visão holística sobre a sociedade, entre outras. Apenas assim, será possível uma mudança de mentalidade das massas e o desenvolvimento sustentável de um projeto de nação. Portanto, apenas por meio da forte intervenção do Estado na economia, respeitando as liberdades e o empreendedorismo, para superar a dependência econômica com o estrangeiro e promover a libertação política e econômica do Brasil.

Obs: leia o artigo na integra.

Cássio Moreira é economista, pós-doutor em História (UFF), doutor em Economia do Desenvolvimento (UFRGS) e professor do IFRS – Câmpus Porto Alegre.