1993: uma aula de política partidária

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O ano era 1993. O Brasil se preparava para votar no plebiscito que viria a escolher (pela segunda vez na História) o sistema Presidencialista contra o Parlamentarismo. Engajado na Juventude Socialista do PDT desde o ano anterior, quando das manifestações do Fora Collor, eu frequentava a sede do PDT no Rio de Janeiro diariamente. Numa noite daquele ano, consegui entrar e assistir uma reunião de Diretório Nacional para tratar a respeito do plebiscito. E o que ali assisti, na verdade, foi uma gigante aula de política democrática no contexto de um partido político.

A reunião era comandada por Leonel Brizola, e me recordo que a seu lado na mesa estavam Neiva Moreira e Darcy Ribeiro. A posição do PDT já se sabia muito bem qual era: era a mesma do plebiscito de 40 anos antes. Presidencialismo! Apenas com um sistema de governo que permitisse ao Estado comandar um projeto emancipador e desenvolvimentista nós poderíamos sonhar com o Brasil soberano e justo que todos desejávamos.

Porém, estávamos em uma tensa reunião de Diretório Nacional para decidir formalmente aquilo que todos sabiam que seria nossa posição.

Por que? Naquela noite, aprendi o fundamento da Democracia no contexto de um partido. Waldir Pires, Nelson Wedekin e outros filiados importantes eram parte de uma minoria no PDT de então. Defendiam, por justa e limpa convicção, o Parlamentarismo. Tinham o direito de disputar sua posição, e disputaram-na com argumentos. Foram ouvidos sabendo que estariam derrotados por todos os que sabiam que seriam vencedores.

Lembro perfeitamente de Wedekin terminando sua intervenção com as frases: “Nós, parlamentaristas do PDT, somo mais trabalhistas do que parlamentaristas; nós, parlamentaristas do PDT, somos mais socialistas do que parlamentaristas; nós, parlamentaristas do PDT, somos mais Leonel Brizola para Presidente do que parlamentaristas”. Arrancou aplausos veementes tanto da maioria formada como da minoria derrotada.

Finalmente, a reunião se concluiu com a posição tirada como se previa. E o partido estava, apesar da divergência, totalmente coeso na decisão. Quem perdeu teve respeitada sua dignidade de lutar pelo que pensa; quem venceu teve a dignidade de lutar uma contenda que na prática já se sabia decidida.

26 anos depois

Trago estas memórias devido à defecção mais recente que se verifica com enorme tristeza nas fileiras trabalhistas. Alguém acha que Waldir Pires, Nelson Wedekin e os parlamentaristas do PDT foram para o plebiscito traindo a decisão tomada no partido? Não, foram a público pregar o Presidencialismo ou, na pior hipótese, silenciar. E assim o PDT contribuiu decisivamente para aquela vitória política.

Hoje, Tábata Amaral alega razões de consciência para justificar seu voto contrário à decisão partidária, pinta-se com as cores de uma suposta coragem e independência e ainda joga lama no PDT, acusando o partido de ser centralista, antiquado e pouco democrático.

Quanto contraste! Por que não defendeu sua posição a favor da reforma previdenciária de Paulo Guedes na reunião de Diretório Nacional, quando, mesmo que fosse vencida, nos teria mostrado a cara de uma vez? Por que não estabeleceu antes, quando teria sido voto vencido, o limite do qual não passaria? Bastava ter iniciado aí seu afastamento e, após o voto em favor do poder financeiro e sua retórica de arrocho, sair do PDT.

Mas não: levou muita gente a acreditar que sua posição seria respeitosa à decisão tomada pelo Diretório Nacional do qual ela participa. Não foi clara, deixou que formar ao redor de si uma dubiedade que um tema divisor como este não comportava. Não foi grande como Waldir Pires, Wedekin e outros que 26 anos antes souberam divergir, opinar, perder e seguir a política. Se eles romperam, o fizeram às claras.

Mas esta parece ser a tônica da chamada “nova política”, aquela que dilui fronteiras de posição e convida à enganação.

Por ter feito dupla política, enganando parte da militância e da direção do PDT, Tabata Amaral está mais do que convidada a Costear o Alambrado. Será que ela sabe o que isso significa?