Caminho de ação Trabalhista

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Parte 1 – Paciência, preparo, trabalho duro e a audácia necessários para agarrar uma oportunidade histórica

Trecho do texto “Caminho de ação Trabalhista – Uma estratégia para o trabalhismo revolucionário tomar a vanguarda do movimento trabalhista”:

Por Daniel Albuquerque – O movimento trabalhista brasileiro encontra-se em um momento crítico de sua história. Esta tradição política genuinamente brasileira, vivencia uma experiência de “ressurreição” cativante, após ter seu projeto e memória sabotados, com direito, inclusive, ao nefasto período da ditadura cívico-militar, maior exemplo da obstinação da classe dominante brasileira, que em conluio com amplos setores americanófilos de nossas forças armadas, como diria Chico Buarque em sua canção “Roda Viva”, impediram o florescimento da “roseira mais linda que há[1], a construção de um Brasil pelos, e para, os brasileiros.

Há de se ressaltar que, para fins de critério, caracterizo por povo, a exemplo da classificação de Nelson Werneck Sodré no livro “Quem é o povo no Brasil?”, apenas a classe trabalhadora, visto que nossa classe dominante não se considera parte da cultura nacional, pelo contrário, a despreza em busca de uma identidade europeia, ou americanófila. Dado o nível de associação submissa desta às classes dominantes de outros países, atreladas ao imperialismo, não é de se espantar que quando existam representantes nacionalistas da classe dominante, não passem de exceções que confirmam a regra.

Apesar de tal ressurgimento, o movimento trabalhista brasileiro enfrenta problemas de gravidade inescapável, ao mesmo tempo em que seus inimigos históricos, mais poderosos do que nunca, erguem suas carabinas e apontam um retorno a um passado anterior ao nascimento do glorioso Trabalhismo Brasileiro.

Exatamente o mesmo passado que foi destruído em 1930, e progressivamente sendo enterrado para trás com a criação do Brasil moderno de 1930 até 1964, junto da criação de todo o legado da tradição do Trabalhismo Brasileiro, justamente em oposição a este passado oligárquico com contornos de atraso, submisso e subdesenvolvido.

Não por acaso Vargas segue sendo mais atacado por tudo que fez de louvável, do que pelo que teve de equívocos, e pelo que aquela “Era” que carrega seu nome, teve de abjeta.

Os ultraliberais, saqueadores da nação e do povo brasileiro, não atacam o bolsa-família, na realidade apenas o reeditam em seu benefício próprio. Por outro lado, do legado do Trabalhismo Brasileiro, destroem a CLT, sabotam e almejam se desfazer da Petrobrás, da Eletrobrás, atacam as noções de décimo terceiro salário, avançam de forma maliciosa sobre as noções de salário mínimo, de Estado-Nacional indutor do desenvolvimento econômico, de construção de um mercado interno, e dinamitam o conceito de necessidade histórica de superação de nosso subdesenvolvimento e atraso industrial na disputa pela vanguarda cientifico-tecnológica a nível global.

O movimento trabalhista brasileiro, se encontra então, numa encruzilhada:

Se o “espírito do tempo”[Zeitgeist[2]], e como este não existe de forma autônoma, claro, as condições materiais, urgem para a formatação do Estado-Nacional brasileiro para ser utilizado como um escudo que minimize as pressões advindas das mudanças no cenário internacional e do imperialismo, bem como pressões de eventuais parceiros comerciais e de bloco que pensem que o Brasil se colocaria em situações arriscadas ou de submissão, apenas para satisfazê-los. Bem como a utilização desse mesmo Estado-Nacional para organizar e induzir o crescimento da economia, aumentando em si a infraestrutura pública, e também em abrangência, ao mesmo tempo que cria toda a sorte de infraestruturas públicas, de uso coletivo, que preparem o Brasil para questões concretas que estão por vir, como os efeitos do aquecimento global próximo a linha do equador, com ondas de calor, que segundo estudos, poderão vir a matar mais de mil pessoas por ano a partir de 2030[3].

Por outro lado, o movimento trabalhista, após renascido, ainda imaturo, tem de moldar a si próprio, e suas próprias concepções, para que não desperdice essa oportunidade histórica, na qual sempre trabalhou com maestria, “o vácuo[4].

Para que isso seja possível, primeiro, é importante entender como funciona a militância do movimento trabalhista brasileiro neste momento:

O movimento trabalhista brasileiro, que sofreu um período de declínio, sem chegar a morrer, após a morte de Brizola, teve um enorme crescimento desde 2018, sobretudo em camadas mais jovens da população. Diz se que o PDT, representante legítimo do Trabalhismo Brasileiro, nesse período, filiou mais jovens em todo o país que o PSOL. Além disso, este aumentou bastante o número de simpatizantes não filiados.

Algo que é muito positivo. Mas que pode se tornar um enorme problema para a tradição do trabalhismo brasileiro, se esta não conseguir passar um bom processo de formação política coerente. Não se trata apenas de ter militantes, quantidade, mas de ter, também, muita qualidade.

Esse movimento, gerou um enorme fluxo de pessoas, algumas delas atraídas por Ciro Gomes, outras apenas oportunistas, que visavam se aproveitar do partido, e um número surpreendentemente grande de pessoas interessadas na história do partido e da tradição do Trabalhismo Brasileiro.

Tais grupos, divergem em ideologia, sendo esta uma afirmação mais ou menos óbvia, enquanto o primeiro grupo segue os posicionamentos de Ciro Gomes sobre o “Projeto Nacional de Desenvolvimento”, esses estão mais ao centro, e muitas vezes, tomam posições que podem ser consideradas “senso comum”.

No segundo grupo, podemos encontrar tanto fisiológicos, quanto liberais e representantes de outras ideologias avessas a tradição e a história do PDT, que conjunturalmente tentam se aproveitar do partido.

Por outro lado, no terceiro grupo, reside um enorme grupo de jovens ainda em formação política, compreendendo a história do trabalhismo brasileiro e seu caminho de transformações quando em contato com a classe trabalhadora brasileira e com as condições materiais impostas ao nosso país ao longo da história. Estes formam o que podemos chamar de núcleo duro intelectual do que é a real retomada do trabalhismo brasileiro, que está muito além de meras eleições, e muito além de Ciro Gomes e seu projeto.

Muitos deste último grupo já se filiaram ao Partido Democrático Trabalhista, enquanto um bom número apenas orbita o partido e contribui com o movimento trabalhista, em geral, enquanto simpatizantes.

Este terceiro grupo, ainda que este esteja em formação, seja “jovem” e esteja confuso acerca de muitas questões importantes no debate político, é de longe o grupo mais organizado e coeso dentro da militância trabalhista, e em um nível mais geral, neste grupo está a alma deste ressurgimento do movimento trabalhista, que é historicamente, em sua essência, como afirma o historiador Moniz Bandeira em seu livro “Trabalhismo e Socialismo no Brasil”, um movimento de base.

O potencial para a formação de intelectuais orgânicos, comunicadores, lideranças comunitárias, em suma pessoas que construam o Projeto Nacional de Desenvolvimento do Partido Democrático Trabalhista, tanto no aspecto de influir em seu conteúdo, levando-o em direção, cada vez mais, para a criação de uma Democracia-Popular, quanto de coloca-lo socialmente em prática, neste grupo mencionado, é gigantesco.

Em uma época como a que vivemos, em que a juventude em sua grande maioria não tem uma única centelha de esperança nos partidos tradicionais, a importância de se ter tal militância não deve ser ignorada. É invejável o número de páginas, mídias, e veículos, de qualidade, que integrantes deste grupo operam e gerenciam, tanto em redes sociais quanto em outros espaços de militância.

Enquanto tal terceiro grupo, certamente representaria aqui, a “qualidade”, no sentido de, diferentemente dos outros grupos, estar em maior “sintonia” com a história do partido, a tradição que este representa, e os desígnios e problemas jogados em nosso caminho por nossa era, os outros grupos, ainda assim, representam a “quantidade”.

Não significa dizer aqui, e espero que fique registrado, que não existem militantes sinceros quanto a suas intenções, honestos, devotados e admiráveis nos outros grupos. Mas tratando de analisar a questão de forma um pouco mais geral, tais grupos além de desorganizados, se encontram, ainda, afastados da tradição, sua história e seu significado.

Existe um grande movimento por parte do Partido Democrático Trabalhista, da Juventude Socialista, e outros organismos, no sentido de prover formação política para a maior parte destes militantes. O que é mais do que louvável, um sintoma de que o partido está compreendo o momento histórico e o que está ocorrendo em seu interior.

Ainda assim, é evidente que forças mais ou menos alheias, tanto aos interesses do Projeto Nacional de Desenvolvimento, quanto à construção de uma teoria revolucionária que permita o trabalhismo ser de fato o caminho brasileiro para o socialismo, se aproveitam da confusão, inocência, e formação política não-conclusa, para cooptar militantes sinceros, macular concepções ideológicas caras para a tradição do trabalhismo brasileiro, bem como a tentativa de revisionismo da gloriosa história da tradição por parte de alguns grupos sectários e oportunistas. Sem mais delongas, dando nome aos bois:

bizarra quimera conhecida como Quarta Teoria Política, e a já conhecida hidra Liberal, que tendo duas cabeças, uma progressista e outra conservadora, tenta se infiltrar o movimento trabalhista com a primeira, enquanto se infiltra em movimentos e partidos de direita com a segunda.

Algo muito sério está em jogo, a cada segundo que um trabalhista respira:

A pureza, e, principalmente, a verdade da tradição, serão maculados neste processo?

Não pensemos que se trata, nem por um único segundo, de uma questão pequena, muito menos uma questão eleitoral. A questão aqui é muito maior:

Qual será a postura do movimento trabalhista brasileiro?

Ela será digna e compatível com a gigantesca tradição que este ostenta?

O momento histórico praticamente implora pelo retorno do trabalhismo. Não por acaso, vieram com os militantes sinceros, toda a sorte de oportunistas e sabotadores. Será que o movimento trabalhista estará, tanto teoricamente, quanto em termos de sua prática, à altura do desafio histórico?

Parte 2 –  “Você não sabe o valor que o trabalhismo brasileiro tem…” – Por uma defesa intransigente da tradição do Trabalhismo Brasileiro e um avanço de sua prática e teoria:

Urge, portanto, que tal grupo, que na prática já age como vanguardase organize propriamente para tal, sem nenhum tipo de receio ou de constrangimento pois, estando amparados na tradição e em sua história, não importa o tamanho do obstáculo, somos então, também, seus legítimos representantes. Basta que estejamos em sintonia com a verdade que esta representa. Parafraseando, com certa liberdade artística, o que costumam dizer os camaradas maoístas: “Temos de ousar lutar, temos de ousar vencer.”

A verdade, é que cabe a nós, os mais jovens, tomar essa oportunidade histórica, de direcionar o movimento trabalhista, em nossas mãos. Se não vier de nós, da base, mais sincera e radical quanto a seus ideais, não virá de lugar algum.

Isso sempre foi desta forma, não por acaso a trajetória de Leonel Brizola, o homem que mais amou o povo brasileiro, quando jovem no PTB, foi marcada exatamente por essa postura intransigente de defesa da pureza da tradição, seus ideais e suas premissas, sem nunca renunciar seu avanço, desde que na direção correta, que continuasse expressando a verdade da tradição.

Sua defesa apaixonada do nacionalismo-popular revolucionário no período pré-golpe de 64 expressa exatamente esta verdade, o inconformismo de quem percebia que a tradição não poderia ficar aquém do que seus compromissos históricos requisitavam, rumando cada vez mais para a concepção de criação de uma República Democrática Popular, sob inspiração da tradição do trabalhismo brasileiro em conjunto com todo o movimento socialista do Brasil. Algo que fica mais ou menos claro no livro “Trabalhismo e Socialismo no Brasil.”, de Moniz Bandeira, em seu capítulo sobre Brizola, e sobre a aliança entre socialistas e trabalhistas no período histórico tratado acima.

Esta mesma verdade é reiterada quando no ato da confecção da “ Carta de Lisboa”, no ano de 1979, é proclamado, e aclamado pelos presentes, que:

“O trabalhismo é o caminho brasileiro para o socialismo.”
-Leonel Brizola.

Tal afirmação guarda um enorme poder, e ao mesmo tempo, uma enorme missão e responsabilidade:

Se o trabalhismo não for, hoje, o caminho brasileiro para o socialismo, então temos um problema aí, e devemos corrigir as rotas e as teorias, porque, conforme proclamado por Brizola, a intenção prática e teórica do trabalhismo brasileiro, se até aquele ponto não era essa, daquele momento em diante passa a ser uma só:

SER O CAMINHO BRASILEIRO RUMO AO SOCIALISMO.

Caso o contrário, tudo o que for feito é uma traição a verdade histórica representada pela tradição e seu caminho até aqui em contato com a classe trabalhadora, ou seja, o povo brasileiro, vendida como “novidade anti-hegemônica” ou como “modernidade progressista”.

Alguns demagogos e fariseus, pessoas que não sabem o valor que o trabalhismo brasileiro tem, e cuja única intenção é o oportunismo, tiram o nexo histórico, e o contexto material da trajetória da tradição, desde seu nascimento até os dias atuais. Apontam para momentos longínquos da história da tradição do trabalhismo brasileiro, descontextualizando seu nexo histórico, como se a memória, ou seja, o espírito da tradição, não fosse um organismo vivo e dependente daqueles que, portando seu estandarte, fizeram no passado, e, ainda hoje fazem a sua história. A utilizam, porém, apenas como um compilado de argumentos prontos para posicionamentos, que no atual contexto, são, no mínimo, dúbios e vacilantes.

Articular trechos da história da tradição conforme seus interesses, num jogo de espelhos, não respeitando seu próprio movimento autônomo ao longo da história rumo a uma concepção de construção do socialismo no Brasil, e da construção de uma República Federativa Democrática Popular, é revisionismo. E para além disso, UMA TRAIÇÃO AO ESPÍRITO DA TRADIÇÃO DO TRABALHISMO BRASILEIRO.

Visto que tanto o primeiro grupo quanto o segundo descritos no começo deste texto, são majoritariamente anticomunistas e não muito simpáticos, nem mesmo, ao socialismo democrático, e, portanto, por desconhecer a tradição e seu percurso, estão mais afeitos a “comprar” concepções revisionistas e falsificadas. Fica claro que, neste momento, a maior força capaz de defender a noção de construção do socialismo brasileiro pela tradição do trabalhismo, é, ainda que confuso, imaturo politicamente e em formação, o terceiro grupo referido no começo desse texto, associado a militância de base Brizolista, que ainda tem muita força dentro do movimento trabalhista, felizmente, ainda acreditam e reivindicam a construção do germe do socialismo aplicado no Brasil, chamando-o de “Socialismo Moreno”.

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Por Daniel Albuquerque, Niterói, texto escrito em setembro de 2020.

Referências

Referências
1 Em sua música, “Roda Viva”, Chico Buarque nos traz a seguinte construção:

“A gente vai contra a corrente

Até não poder resistir

Na volta do barco é que sente

O quanto deixou de cumprir

Faz tempo que a gente cultiva

A mais linda roseira que há

Mas eis que chega a roda viva

E carrega a roseira pra lá”

Dado o contexto de lançamento da música, no ano de 1967, três anos após o golpe de 1964, e apenas um ano antes do endurecimento do regime, com o AI-5, em 1968, é inferível que, “a mais linda roseira que há”, derrubada ciclicamente pela “Roda Viva”, é uma das mais belas metáforas para beleza estonteante que é a construção nacional-popular do germe socialista no Brasil, de uma pátria feita por, e para, os trabalhadores brasileiros, e também demonstra a obstinação de nossa classe dominante em podar qualquer impulso popular de construção coletiva de um projeto de país, e, consequentemente, de um próprio Brasil que nunca existiu além da esfera da possibilidade.

2 Um breve comentário sobre a tradução do termo “Zeitgeist”:

O termo “Zeitgeist”, do alemão, é um conceito filosófico, relacionado ao autor alemão, Georg Wilhelm Friedrich Hegel, geralmente traduzido para o português como “espírito do tempo”.

Mas, visto que a palavra alemã, “geist”, pode ter inúmeros significados a depender do contexto utilizado, e pode ter significados que, em certas ocasiões possam traduzidos como “mente”, “consciência”, “fantasma”, dentre outras traduções, recomendo, além de “espírito do tempo”, a tradução de tal conceito pensando em termos de “consciência do tempo”.

3 Sobre as possíveis mortes em decorrência do aquecimento global e de ondas e calor no norte e nordeste do Brasil, caso o Estado-Nacional brasileiro não cumpra com suas atribuições.

Esse é apenas um exemplo de emergência de médio prazo, questões de vida ou morte, que apenas o Estado-Nacional pode resolver, mas que subjugado pelo interesses de nossa classe dominante subalterna, e aos desígnios do imperialismo e da ortodoxia econômica, sem um governo verdadeiramente popular, não seremos capazes de resolver.

Fonte: https://sustentabilidade.estadao.com.br/noticias/geral,brasil-tera-aumento-de-mortes-por-ondas-de-calor-afirma-estudo,70002424589

4 O vácuo político, como se diz, não dura muito tempo. Sempre é ocupado por alguma força presente no jogo.

Com o fim do ciclo do neoliberalismo progressista como representante da esquerda partidária brasileira enquanto gerente da banca, no poder, ao mesmo tempo em que o neoliberalismo econômico enfrenta uma de suas piores crises enquanto doutrina, ocorre, também uma abertura para o novo, o futuro indeterminado, referente a um presente ainda em disputa.

Dando assim, apesar da ascensão da extrema-direita e seu momentâneo poder, uma oportunidade para a esquerda nacionalista e a esquerda radical pautarem os seus projetos e aproveitarem essa oportunidade histórica contra seus inimigos comuns, a classe dominante e o imperialismo.