A opinião pública está sendo inundada por análises sobre Previdência. Elas mantêm aparência de bom senso e razoabilidade. Ninguém, aparentemente, pode discordar. Hoje foi o dia de Carlos Alberto Sardenberg, em O Globo:
“A despesa com pagamentos de pensões a aposentadorias (do INSS e do setor público) é o maior item federal. […] Essa despesa tem sido crescente. No outro lado das contas, das receitas, aparecem as contribuições pagas pelos trabalhadores da ativa. Aqui aparece o déficit previdenciário: o total das contribuições não cobre o total das aposentadorias. O déficit é crescente: R$ 285,5 bilhões no ano passado, contra R$ 268,8 bilhões em 20187.”
O raciocínio é claro. Parece irrespondível. Mas está errado. Leiam este trecho do meu trabalho sobre Previdência:
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“A Lei de Responsabilidade Fiscal, de 2000, criou o Fundo do Regime Geral de Previdência Social, que passou a centralizar os recursos destinados a pagar os benefícios do RGPS. Ele é a principal referência dos dados que saem na imprensa. O problema é que esse fundo ignora os dispositivos constitucionais, seja por separar Previdência e Seguridade, seja por considerar que são do Tesouro várias receitas que a Constituição instituiu como próprias da Seguridade.
A legislação infraconstitucional atropelou a Constituição, ignorando o amplo mecanismo de financiamento estabelecido em 1988. Na contabilidade apresentada à opinião pública, a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), a Cofins e os recursos arrecadados pelos concursos de prognósticos são considerados receitas do Tesouro. A participação da União no financiamento da Previdência é ignorada. Somente as contribuições de empregados e empresas que incidem sobre a folha de salários aparecem como receitas próprias do sistema.
Além disso, juntam-se receitas e despesas do RGPS [INSS] e do RPPS [setor público], que, como vimos, são instituições diferentes, uma gerenciada pelo INSS, outra pelo Tesouro Nacional. O RGPS, como o nome diz, é um regime geral, enquanto o RPPS é um regime fechado, que não integra o sistema da Seguridade Social. Essa segunda confusão lança sobre a Previdência pública encargos que não são seus.
Com receitas comprimidas e despesas expandidas, a Seguridade aparece como deficitária. Para cobrir esse déficit, parte dos seus recursos retorna a ela, mas sob a rubrica “transferências da União”. Assim, ela se torna responsável por grande parte da crise fiscal.”
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Meu texto completo sobre Previdência está aqui.
Observação final: quem se der ao trabalho de ler meu texto verá que ele é moderado e respeitoso. Tentei, de diversas maneiras, estabelecer um diálogo construtivo sobre o problema da Previdência. Só levei pedradas. Agora trato a proposta de reforma da Previdência apresentada pelo governo pelo que ela, de fato, é: business. Os conservadores não querem construir nada. Querem ganhar dinheiro.
Por Cesar Benjamin.
A informação que esse artigo apresenta foi importante para mim. Eu gostaria de agradecer ao autor por tê-lo escrito. Eu não sabia do Fundo do RGPS na LRF e nem do erro na apresentação das fontes de receita. Mais tarde, com tempo, vou ler as 28 páginas do seu trabalho. Grato pela informação!
Os auditores da Auditoria Cidadã da Dívida já estão demonstrando isso há muito tempo. O povo gado continua sendo enganado.
[…] últimos tempos assistimos a um grande debate sobre os destinos da Previdência, que está no centro do pacto social instituído pela Constituição de 1988. Eu mesmo fiz uma […]