CESAR BENJAMIN: A Picaretagem da Previdência

Agora trato a proposta de reforma da Previdência apresentada pelo governo pelo que ela, de fato, é: business. Os conservadores não querem construir nada. Querem ganhar dinheiro.
José Cruz/Agência Brasil
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A opinião pública está sendo inundada por análises sobre Previdência. Elas mantêm aparência de bom senso e razoabilidade. Ninguém, aparentemente, pode discordar. Hoje foi o dia de Carlos Alberto Sardenberg, em O Globo:

“A despesa com pagamentos de pensões a aposentadorias (do INSS e do setor público) é o maior item federal. […] Essa despesa tem sido crescente. No outro lado das contas, das receitas, aparecem as contribuições pagas pelos trabalhadores da ativa. Aqui aparece o déficit previdenciário: o total das contribuições não cobre o total das aposentadorias. O déficit é crescente: R$ 285,5 bilhões no ano passado, contra R$ 268,8 bilhões em 20187.”

O raciocínio é claro. Parece irrespondível. Mas está errado. Leiam este trecho do meu trabalho sobre Previdência:

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“A Lei de Responsabilidade Fiscal, de 2000, criou o Fundo do Regime Geral de Previdência Social, que passou a centralizar os recursos destinados a pagar os benefícios do RGPS. Ele é a principal referência dos dados que saem na imprensa. O problema é que esse fundo ignora os dispositivos constitucionais, seja por separar Previdência e Seguridade, seja por considerar que são do Tesouro várias receitas que a Constituição instituiu como próprias da Seguridade.

A legislação infraconstitucional atropelou a Constituição, ignorando o amplo mecanismo de financiamento estabelecido em 1988. Na contabilidade apresentada à opinião pública, a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), a Cofins e os recursos arrecadados pelos concursos de prognósticos são considerados receitas do Tesouro. A participação da União no financiamento da Previdência é ignorada. Somente as contribuições de empregados e empresas que incidem sobre a folha de salários aparecem como receitas próprias do sistema.

Além disso, juntam-se receitas e despesas do RGPS [INSS] e do RPPS [setor público], que, como vimos, são instituições diferentes, uma gerenciada pelo INSS, outra pelo Tesouro Nacional. O RGPS, como o nome diz, é um regime geral, enquanto o RPPS é um regime fechado, que não integra o sistema da Seguridade Social. Essa segunda confusão lança sobre a Previdência pública encargos que não são seus.

Com receitas comprimidas e despesas expandidas, a Seguridade aparece como deficitária. Para cobrir esse déficit, parte dos seus recursos retorna a ela, mas sob a rubrica “transferências da União”. Assim, ela se torna responsável por grande parte da crise fiscal.”

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Meu texto completo sobre Previdência está aqui.

Observação final: quem se der ao trabalho de ler meu texto verá que ele é moderado e respeitoso. Tentei, de diversas maneiras, estabelecer um diálogo construtivo sobre o problema da Previdência. Só levei pedradas. Agora trato a proposta de reforma da Previdência apresentada pelo governo pelo que ela, de fato, é: business. Os conservadores não querem construir nada. Querem ganhar dinheiro.

Por Cesar Benjamin.