Covid-19 na Suécia: No Hemisfério Norte, somos todos racionais

Covid-19 na Suécia No Hemisfério Norte, somos todos racionais
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Fala-se há mais de mês sobre a ineficiência do “modelo sueco” de contenção ao Covid-19. Quando Bolsonaro apontou nesta semana a Suécia como exemplo a ser seguido pela recusa ao isolamento social radical, pipocaram críticas à ideia enfatizando a ineficácia do regime de controle à pandemia aplicado pelo Estado nórdico.

O que impressiona é que parece que tal “modelo sueco” é um dado consumado que flutua no éter. As críticas que li a essa política de saúde pública NUNCA personalizam o problema local nem apontam culpados. O primeiro-ministro sueco Stefan Löfven nunca foi acusado pela imprensa brasileira ou estrangeira de ser “genocida”, “criminoso” ou “inimigo da ciência”.

As autoridades de saúde sueca nunca foram denunciadas nominalmente pela mídia internacional como negligentes ou incompetentes. Aliás, sequer o nome do primeiro-ministro sequer é mencionado, os partidos políticos do país – seja governo, seja oposição – são solenemente ignorados, não se explica se o governo sueco é de direita, esquerda, centro ou sei lá o que, e não há análises históricas sobre as razões e implicações políticas desse regime de quarentena admitido por lá. O “modelo sueco” simplesmente é divulgado como um dado curioso da realidade, e fica por isso mesmo. Nenhuma figura pública é cobrada, atacada ou contestada.

Tudo me leva a deduzir que essa “impessoalização” automática das críticas ao “modelo sueco” ocorre por um fato muito simples: a Suécia é um país da Europa. A imagem que se tem no Brasil acerca de um Estado nórdico está destituída, desde sempre, das adjetivações aplicadas historicamente às nações do Sul global.

Assim, um primeiro-ministro sueco nunca será facilmente taxado de “louco”, “fanático” e “lunático”, mesmo quando o país despreza as recomendações difundidas mundialmente pela OMS. Não há “patologização” dos atores políticos de lá. Pode-se até criticar as ações de governo, mas estas nunca serão enquadradas publicamente como epifenômenos de “autoritarismo” ou mesmo de “radicalismo”.

Afinal, a Europa, a primeira morada do Welfare State, é o reino da razão sobre a Terra. Governantes “irracionais” – de direita ou de esquerda – devem ser exclusividades do lado sul da Linha do Equador.

Por Gabriel Deslandes

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  1. Creio que as causas são mais profundas que essa, amigo. Sim, há um “respeito à autoridade europeia”, ainda mais no super-mundo do norte, como não se tem com o sub-mundo do sul. Esse é um fato. Mas há bem mais que isso em jogo. Há, para mim, um despreparo absurdo da mídia (e da construção do conhecimento na comunidade em geral) em procurar entender todos esses contextos que vc cita. Uma coisa é a identificar, apontar e criticar escolhas erradas (como é o caso da Suécia diante da pandemia, que fique bem clara minha opinião), no entanto é preciso identificar, apontar e analisar os contextos onde tais escolhas ocorrem. Vejamos, no Japão (porque esse contexto é supostamente um pouco mais conhecido), ninguém tb criticou quando eles foram negligentes no começo da escalada do corona. Daí semanas se passaram? Logo depois os japoneses deram uma resposta e refrearam a curva exponencial. Na verdade, em menos de 1 mês eles simplesmente conseguiram controlar o vírus. A mídia tb não se interessa por eles, como não se interessa pela Suécia. Lá (voltando à complexidade do tema), a escolha foi liberar para o indivíduo decidir sobre sua rotina. Demonstrou-se um erro. Mas perceba que a curva jamais chegou a ser exponencial! A razão de 1:1 não foi extrapolada. E o sistema de saúde assim não sofreu tanto. (crivo meu, posso estar enganado). Meu parâmetro são apenas os gráficos que acompanho e as matérias que leio de lá. O que quero dizer, camarada, é que na Suécia, com toda sua tradição de socialismo liberal (que não a isenta das contradições do capitalismo), houve um erro baseado numa confiança quase que ingênua no bom-senso da população (outro crivo meu), sem jamais ter havido charlatanismo, nem um sistema destrutivo das instituições (incentivado pelo governo), nem o culto à desinformação, nem o acinte contra a ciência, nem o discurso genocida que a economia está na frente da vida humana. Tudo isso deporia contra a tradição sueca de respeito aos homens e as mulheres. Daí que, cá na Grã-Brasília, não é interessante nem para os fascistas contextualizarem tal cenário (porque jogaria por terra qualquer comparação absurda que o presidente imbecil faz), nem a opinião pública (porque o imediatismo das análises faz demonizar o erro como se sempre escondesse desvios estruturais condenáveis). A vida é mais complexa que isso. As sociedades são mais complexas que isso.

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