Próxima fase da crise institucional: espionagem?

Sessão do Congresso Nacional em comemoração aos 30 anos da Constituição Brasília(DF), 06/11/2018 crise institucional toffoli stf bolsonaro espionagem
Foto: Daniel Ferreira/Metrópoles
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O governo Bolsonaro não tem nem três meses e já viveu diversas crises governamentais, e há uma crise institucional que é permanente. Bolsonaro está mantendo o discurso, e a prática, de confronto contra a política, que ele chama de “velha”. Depois de duas semanas de intensas agressões públicas entre o Executivo e o Congresso, parece haver uma trégua, ainda que frágil. Mas uma nova fase dessa luta entre política e anti-política, que o bolsonarismo e o lavajatismo promovem, parece estar prestes a explodir segundo nota do site O Antagonista na noite desta sexta-feira, 29 de março.

Segundo O Antagonista, paira sobre Brasília um clima de tensão e temor devido uma disputa de inteligência e contrainteligência dentro do Estado brasileiro. Membros do Legislativo, do Judiciário, e inclusive do Executivo, de onde partiria a iniciativa, estariam sendo grampeados ilegalmente. Já havia a suspeita devido ao vazamento de conversas do ministro Onyx Lorenzoni, e também de um deputado federal, Julian Lemos, que desconfiaria que o mandante do grampo de que foi alvo seria Carlos Bolsonaro, filho do presidente. Nada disso havia chamado maior atenção até então:

“O temor, no entanto, aumentou sensivelmente depois que a Presidência da República requisitou à Polícia Federal a cessão de um delegado e três agentes especializados em ações de inteligência e contrainteligência. Integrantes do Judiciário e do Legislativo desconfiaram da medida, cujo objetivo até hoje não foi esclarecido.”

Do outro lado, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, instaurou inquérito para investigar ameaças e ataques virtuais de notícias falsas contra o STF. O ministro relator escolhido para tal tarefa foi Alexandre de Moraes. Essa reação a ataques virtuais fazia sentido por si só. Depois do petismo, o STF tornou-se um dos alvos preferencias da guerrilha bolsonarista e lavajatista na internet. A batalha política na internet tornou-se absolutamente central desde 2013 no Brasil. Bolsonaro é um fenômeno pelo incrível, e obscuramente financiado, profissionalismo de sua volumosa campanha de redes. As fake news, e as disputas de narrativas virtuais, dependem de vultuosos investimentos em monitoramento e processamento de big data, além do impulsionamento e disparo de mensagens nas redes.

No entanto, diante do recrudescimento desse clima de desconfiança, o inquérito instaurado por Toffoli e entregue a Alexandre de Moraes, ganha mais importância ainda e contornos espinhosos. O inquérito não apenas faz parte da luta contra as guerrilhas virtuais, mas também de uma reação à escalada bolsonarista para o campo da espionagem! Diz a nota d’O Antagonista:

“Embora o presidente do STF tenha argumentado que era necessário investigar ofensas e calúnias contra ministros, o que se viu foi a montagem de outro “núcleo de inteligência”, com a convocação, por Alexandre de Moraes, de dois delegados de São Paulo – um da PF e outro da Civil. Maurício Martins da Silva, da Divisão de Inteligência da Civil, já teria atuado inclusive na segurança de Geraldo Alckmin e é especializado em ações de contrainteligência.”

O Antagonista não revela suas fontes, e descreve apenas um suposto “clima de desconfiança”, e conjecturas de seus interlocutores nos bastidores de Brasília. No entanto, a escolha do ministro Alexandre de Moraes para cuidar do inquérito sobre os ataques contra o STF é muito coerente com esse clima de suspeita. Em São Paulo, ele já foi promotor, secretário de justiça, secretário de segurança pública, além de ter sido ministro da justiça de Michel Temer, antes de ser indicado pelo mesmo para o STF.

Um episódio marcante de sua carreira política ainda antes do impeachment de Dilma, quando era secretário de segurança em São Paulo, exemplifica sua experiência e trânsito no meio policial. Marcela Temer, esposa do então vice-presidente, teve seu celular clonado, com e-mails, mensagens e fotos íntimas roubadas, sendo chantageada a pagar 300 mil para evitar o vazamento. Moraes resolveu o caso com incrível rapidez e discrição, prendendo o suspeito e evitando o vazamento, ganhando a confiança de Temer. Não apenas é envolvido com esse tipo de inteligência policial, Moraes é um ministro do Supremo ligado à política, ao PSDB e ao governo Temer, não ao campo da anti-política bolsonarista ou lavajatista.

Dessa forma, apesar da “trégua” protagonizada por Paulo Guedes, Rodrigo Maia, Onyx Lorenzoni, todos preocupados com a truculência política de Bolsonaro, os núcleos duros do bolsonarismo e da Lava Jato não parecem dar sinais de que vão realmente ceder na disputa contra o Congresso, e a nova maioria política do STF. Se for confirmada essa escalada da crise entre os poderes para o campo da espionagem, é realmente um dado que cria muita instabilidade e deterioração institucional.

O conceito de guerra híbrida geralmente é utilizado para conflitos geopolíticos, e caracteriza estratégias não-militares de guerra, como ciberataques, disseminação de fake news, manipulação de agitação política, lawfare (combate judicial aos inimigos), e é claro, espionagem. Portanto, é um termo atrelado principalmente ao tema do imperialismo, e de análises que conectem os acontecimentos nacionais ao cenário internacional. Mas esses elementos podem ser identificados também em dinâmicas internas nas disputas de poder que não necessariamente respondam a um elemento externo específico, evidentemente que o contexto geral do imperialismo permanece.

As guerras virtual e judicial contra as instituições políticas no Brasil já estão instaladas há alguns anos, tendo como marco o triênio 2013/2014/2015, com a manipulação de manifestações de massa e a operação Lava-Jato, que culminaram no impeachment de Dilma em 2016. O fenômeno das fake news foi bastante relevante nas eleições de 2018, e continua sendo nos ataques contra o STF e o Congresso Nacional.

A entrada da espionagem de forma mais agressiva por parte do bolsonarismo, pois evidentemente ela já existe nos grampos de operações policiais como as da lawfare lavajatista, seria uma escalada preocupante no cenário político nacional, consolidando o que se poderia chamar de guerra civil híbrida.