A deprimente entrevista de Lula para Glenn Greenwald

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Vou fazer um desabafo, não esperem aqui meu estilo sarcástico e sistemático porque, sinceramente, a entrevista de Lula me deprimiu. Pelo menos nestes minutos que estou escrevendo isso de roldão.

A gente só vê nela um Lula cheio de ódio – justificado, quero deixar claro – repetindo aqueles ufanismos vazios (“a maior distribuição da história”, “nunca os pobres ganharam tanto”, “quem diz é a ONU”) que quanto mais a gente estuda economia e história mais cansa. Exaure, na verdade. Não tinha percebido isso antes, mas a voz de Lula hoje me cansa.

Confrontado sobre se achava que o neoliberalismo nos governos do PT tinha papel no ódio pelo partido, Lula foge três vezes da pergunta. Quero deixar claro que não acho que o PT tenha sido um governo neoliberal como insinuou Glenn, mas foi meramente um governo social-liberal rentista.

Sobre a parte que ele fala de Ciro, também mais do mesmo. A única coisa nova é a confissão de que de fato não deixou Haddad ser vice dele.

Repete a falácia de que se o povo quisesse votar em Ciro no segundo turno, teria votado no primeiro. Mas não é essa a questão. A questão é o porquê de o povo não ter votado em Ciro no primeiro, como Glenn lembrou, o desmascarando.

E o povo não votou em Ciro no primeiro não é somente porque Lula não quis o apoiar, mas porque Lula o elegeu como seu principal inimigo e lutou a campanha toda para cercear suas alianças.

Como se não bastasse, colocou a máquina de internet do PT para bater, quase que exclusivamente, nele. Eu ajudei o Ciro na rede, eu vi isso todo dia. O PT sabe que estou falando a verdade.

Porque Lula não deveria ter feito isso? Ora, porque se ele fosse um político com o mínimo de idealismo elegeria como alvo prioritário o PSDB ou o fascismo.

Ou será que ele acha que o tucanismo está mais próximo do petismo do que Ciro?

É isso o que Lula acha que a política obviamente é? Destruir seus aliados em primeiro lugar para que eles não cresçam? Porque ele sorri cinicamente diante de Glenn como se isso fosse óbvio?

Ao contrário do que diz Lula também, no que foi, mais uma vez, desmascarado por Glenn, o PT não foi atrás do apoio do PSB. O PT entregou tudo o que o PSB quis, não para ser apoiado por ele, mas para que o PSB não apoiasse Ciro.

Ele fez isso para que Ciro não tivesse tempo de TV e, o que é pior, para que o tempo de TV do PSB fosse praticamente todo para os candidatos de direita, 60% só para Alckmin. Ao diluir esse tempo entre todos os candidatos, jogou fora tempo de TV para combater Bolsonaro.

O PCdoB, por sua vez, esmagado pela cláusula de barreira, foi materialmente coagido pelo PT, e teve de se submeter para tentar sobreviver. Hoje sabemos que isso foi uma escolha desastrosa, olhando para o resultado eleitoral. É isso que Lula chama de “articulação política”. Entre aliados!

Então Lula pergunta, “O que o Ciro queria, que o PT não fizesse nada?”

Sim, exatamente.

Ele queria que Lula e o PT fizessem sua campanha com o PCdoB ou sozinho, e que o deixassem fazer a dele com o PSB.

Só isso.

Porque ele tinha a certeza de que o PT jamais o apoiaria.

No segundo turno nos acertaríamos. É o que aliados históricos esperam: não serem alvos prioritários. O contrário é o jogo de poder pelo poder, jogado por quem quer o poder e não o melhor possível para todos.

Ao contrário, ao enfraquecer aliados para submetê-los, enfraqueceu todo o campo progressista.

Será que Lula acha isso tudo ingênuo demais a ponto de rir cinicamente?

Lula deixa claro isso quando, cheio de ódio, diz que “o Ciro precisa entender que para que os outros gostem dele, é preciso gostar do outro”. Ora, isso quem tem que entender é amigo ou namorado. O que talvez Lula tenha que entender é que política não deve ser o jogo personalista de acúmulo de poder pessoal, mas sim a busca do máximo benefício público.

Já posso imaginar alguns petistas que conheço rindo desses trechos. Porque altruísmo para eles, e para Lula, é uma coisa ridícula. Moralidade pequeno-burguesa não faz parte da política.

Para você, caro leitor, altruísmo e lealdade são coisas ridículas na política? Ou deveriam ser?

Como Ciro errou em não conversar com Lula se ele se recusou a recebê-lo depois da prisão?

Falando sério com vocês, com sinceridade, fora da minha missão desgastante de responder e oferecer um contraponto a narrativa do PT.
Não duvido que Ciro tenha errado na condução em vários momentos, que coisas poderiam ter sido diferentes, mas hoje não acredito que o PT pudesse apoiá-lo, nunca.

Se aproximar do PT seria só receber sua rejeição sem receber seu apoio e nem sequer sua lealdade, porque essa é a natureza de escorpião do PT. Hoje, essa natureza não é mais segredo para ninguém no Brasil. Ninguém mais confia no PT, e se antes 60% do Brasil o odiava, agora 73% o odeia.

E não, não é por causa dos pobres no aeroporto.

O jornalismo de Glenn é de alto nível, e foi de novo aqui. Ele, sempre que faz uma entrevista, mostra como a imprensa brasileira é um lixo, é vassala, da blogosfera petista à imprensa corporativa. Tenho certeza que na próxima entrevista de Glenn com Ciro ele também o deixará em alguma saia justa porque essa é a função de um jornalista. Obrigado Glenn.

Porque você deixou Lula nu.

Mostrou um Lula que não se comporta como político que pensa no povo em primeiro lugar, como Cristina.

Falo como alguém que passou vinte anos fazendo campanhas para o PT, defendendo Lula e Dilma na rede e nas ruas.

Sim, porque nós sempre fomos aliados leais.

Eu, como toda a esquerda brasileira, cheguei a acreditar um dia que Lula poderia representar a emancipação do povo brasileiro que finalmente teria tomado nas suas mãos as rédeas de seu destino.

Mas ele fez muito pouco, mas muito pouco mesmo, no sentido dessa emancipação e hoje se tornou esse personagem triste, amargurado, cheio de ódio, perseguido sim, barbaramente, em prisão perpétua, mas delatado por seus companheiros de vida inteira. E esse homem, mesmo na solidão da prisão, mesmo diante da morte da esposa, mesmo diante da ameaça da lava-jato e do fascismo, mesmo diante da ameaça de ruína do patrimônio e soberania nacional, só pensou em manter seu poder dentro do PT, a hegemonia do PT na esquerda e ensinar a Ciro uma lição.

Agora quem vai aprender essa lição por no mínimo quatro anos é o povo brasileiro.

Será que Lula acha que o Brasil merecia isso por não ter reagido a sua prisão? As crianças também?

  1. Castañon, irretocável na sua análise. Quando assisti à entrevista, senti o mesmo. Ficam escancarados o egocentrismo e a pequenez de Lula. De fato, deprimente!

  2. Quando em Abril de 2018, Gleisi deixa claro que é Lula ou nada e cogita até em sabotar as eleições, ficou claro pra mim qual era a prioridade do PT. Entregaram a eleição, não sei se por vingança, ou por estarem perdidos, consternados com a situação do Lula. Mas faltou bom senso, maturidade politica. Deixei de fazer campanha pro PT pela primeira vez desde meus 16 anos.

  3. Perfeito sua análise eu diria que o único defeito dela é não observar que sim os governos petistas foram neoliberais, foram uma continuação dos governos tucanos com diferencial maiores políticas públicas sociais. Isso não o torna um governo social-liberal-rentista. Apoiar o rentismo e políticas liberais não torna um governo menos neoliberal, social ou menos ainda socialista (próprio Lula confirma que o governo dele nunca foi socialista). Inventar um amontoado de palavras não vai deixar os governos petistas menos neoliberais.

  4. Altruísmo e lealdade são dentro do campo progressista deveria ser lema. Progressistas sem esses valores estão do lado errado do espectro politico.

  5. Depois do que Lula fez contra o Ciro, pra mim ele morreu e virou apenas uma lembrança. Na prisão, ele poderia ter se tornado um mito, uma lenda, um titã, mas suas atitudes e as mentiras descaradas que repete nestas entrevistas o tornaram apenas um anão, uma minuscula caricatura do que já foi. Ele tornou-se tão desprezível a ponto de afirmar que se o povo quisesse o Ciro, terio votado nele no primeiro turno: hipócrita! Lula sabe melhor do que ninguém, que primeiro e segundo turnos são duas eleições completamente diferentes, pois na primeira, os votos ficam pulverizados entre os vários candidatados participantes, já no segundo, são apenas dois candidatos. Ele sabe muito bem que toda a estratégia no 1° turno deve estar orientada para uma vitória no 2° e as pesquisas se provaram ferramentas indispensáveis na tomada de decisão.

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