E a Frente Povo Sem Medo, tem dono?

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O companheiro Guilherme Boulos se projetou como um líder político nacional com uma postura de agregação dos diversos campos da esquerda brasileira. Por ser de um movimento popular e não de um partido, sempre buscou construir com os diversos partidos e movimentos e ser uma espécie de mediador da unidade – papel que ele e o MTST cumpriram muito bem no período 2015-2017. A lógica aliancista de Boulos era tão forte que ele comprou um desgaste gigante dentro do PSOL mantendo sua proximidade com o campo do petismo e se recusando a fazer críticas frontais e necessárias aos Governos Lula e Dilma.

Mesmo quando candidato à presidência pelo PSOL, Boulos manteve essa postura e soube continuar cumprindo a função de mediação de unidade. Esse ano, porém, Guilherme Boulos caminha para um abandono ou relativização dessa postura e assume a posição de cabo eleitoral do PSOL nas disputas de movimento estudantil, em ano de Congresso da UNE. Até aí, tudo bem. Boulos, ao contrário de seu discurso do ano passado, de construção horizontal programática suprapartidária (coisa que, na real, nunca rolou), é do PSOL e ele tem mais que fazer propaganda do seu partido mesmo. É o mesmo que Haddad correr o Brasil fazendo propaganda do PT ou Ciro Gomes pelo PDT.

Só tem duas pequenas questões nessa temática. A primeira é que a Frente Povo Sem Medo não é uma frente do PSOL. É uma frente fundada por diversas organizações políticas e movimentos populares e transcende em muito o campo psolista. Usar nas eleições da UNE o nome “Juventude Sem Medo”, como as correntes do PSOL estão fazendo, e fazer Boulos correr as universidades do Brasil com o avatar de “líder da Povo Sem Medo” e, nesses espaços, fazer propaganda eleitoral para determinadas forças do movimento estudantil, é um erro. Não existe uma juventude da Povo Sem Medo. Existem várias juventudes, muitas delas que não são do PSOL, como a UJR e a UJC, que compõem a Povo Sem Medo. Esse tipo de tática é uma forma de “privatizar” uma identidade política construída coletivamente. É ruim, é hegemonismo, enfraquece as lutas de unidade e a construção das resistências.

O segundo elemento é que, ao aceitar correr as universidades como cabo eleitoral do PSOL, Guilherme Boulos recusa o papel de fator de unidade e mobilização popular das esquerda. É o tipo de posturas que não precisamos agora. Eu acompanho Boulos em todas as suas redes sociais, mas sinceramente, deixei de divulgá-lo, pois não vou fazer propaganda do PSOL – meu partido é outro, é o PCB. E nesse caso, repito, não tem nenhuma crítica que flerte com o antipartidarismo. Boulos, como quadro do PSOL, tem todo direito de se envolver diretamente em uma disputa do movimento estudantil em prol do seu partido.

Ao fazê-lo, porém, espero que ele e os companheiros do MTST saibam que estão deixando de lado a postura política anterior. Justamente a postura que tornou Guilherme Boulos uma referência nacional. Com esse tipo de ação, Boulos se apequena e passa de líder popular para apenas um quadro do PSOL. Sem desmerecer de forma alguma o PSOL; é pouco, muito pouco, para alguém com as potencialidades que ele tem na política. Além disso, sinceramente, é bem estranho, em período de luta contra a destruição da previdência, estatais, direitos sociais e todas as políticas públicas, mobilizar essa energia para uma disputa do movimento estudantil – coisa que deveria ser feita, prioritariamente, pelos estudantes. Aqui eu lembro das posturas do PCdoB e PT de envolver em eleições estudantis ministros e secretários de governo, governadores, prefeitos, deputados e afins.

Esse não é o momento de fragilizar qualquer instrumento de luta coletiva. Precisamos ampliar, fortalecer e massificar esses instrumentos, e não transformar suas identidades em bandeiras eleitorais privativas de grupo A ou B. Agora, para concluir, só um adendo: eu não estou desconsiderando que nessas caravanas, Boulos também está mobilizando a defesa da previdência social. É algo fundamental e louvável, mas seria profundamente saudável separar essa mobilização de resistência de agitação eleitoral privatista da identidade da Povo Sem Medo.