Perdoar a Globo exige um acerto de contas

Ricardo Capelli, no artigo Hora de perdoar a Globo, defende o necessário papel das Organizações Globo na desmoralização do bolsonarismo no Brasil. Sua posição sobre a emissora coincide com a deste texto. O ponto de divergência maior reside nas eleições de 1989, na boa vontade do bom camarada para com Armando Nogueira e na própria Rede Globo.
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Ricardo Cappelli, no artigo Hora de perdoar a Globo, defende o necessário papel das Organizações Globo na desmoralização do bolsonarismo no Brasil. Sua posição sobre a emissora coincide com a deste texto. O ponto de divergência maior reside nas eleições de 1989, na boa vontade do bom camarada para com Armando Nogueira e com a própria Rede Globo.

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A linha editorial da TV Globo foi idealizada para ser a voz e imagem do jornal homônimo. O empreendimento televisivo tardio – Roberto Marinho já tinha certa idade quando começou – teve o cuidado de esperar cuidadosamente a queda de seus concorrentes e a difusão mais ampla da TV no Rio de Janeiro, defasada pelo monopólio das emissoras paulistas Record e Tupi.

A tentação de unificar os pensamentos de O Globo e da TV Globo é grande. Inclusive, esse era o propósito emissora de TV em seus primórdios. Contudo, a ampliação do conglomerado televisivo criou outras conjunturas que não podem ser desperdiçadas.

Durante suas duas primeiras décadas de existência, a Rede Globo era tocada por Walter Clark e Armando Nogueira (a quem Capelli é excessivamente generoso). Roberto Marinho nem sala particular tinha na emissora. Passava semanas sem frequentar sua rede de televisão, numa época em que havia muito pouco contato que não fosse o presencial.

Não é estranho, portanto, dizer que a consolidação da Globo é em boa parte fruto dos pensamentos de Walter Clark, Armando Nogueira e Boni.

Para o bem e para o mal.

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O samba É preciso perdoar, composto por Alcivandro Luz e imortalizado por João Gilberto no eterno Getz/Gilberto II, é uma ode ao perdão.

“Eu sinto que o perdão / Você não mereceu / Eu quis a ilusão / Agora a dor sou eu”.

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É também lugar comum estabelecer um nexo de casualidade entre o debate de Collor e a demissão de Armando Nogueira, como se Armando tivesse se aborrecido com a ordem de seu superior, Roberto Marinho. Porém, a história é um pouco mais complexa.

Fosse por hombridade, Nogueira não teria organizado a presepada da PROCOSULT, em 1982, episódio em que a emissora carioca buscou fraudar a opinião pública omitindo a vantagem de Brizola, seu maior inimigo. Com a fraude comprovada, Nogueira ainda teve a coragem de discutir ao vivo com Brizola, defendendo a posição da Família Marinho.

Nogueira era diferente dos outros, sem dúvida. Não era próximo de políticos e seus interesses eram mais ligados aos esportes e às artes. Também não era uma figura desleal, como tantos outros de sua geração. Porém, é impossível imaginar que um homem que passou 22 anos como chefe de jornalismo da Globo seja um mero expectador dos erros de sua emissora. Sejam eles nas Diretas já, no período ditatorial ou na redemocratização. Nogueira é também fiador do projeto global de poder.

Para o bem e para o mal.

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O bolsonarismo é indissociável do lavajatismo. Este só existe porque conta com o apoio expresso das Organizações Globo. O papel da emissora já havia sido estabelecido antes, em artigo acadêmico de Sergio Moro, elogioso da operação “Mãos Limpas” na Itália e do papel da mídia italiana na anti-política que desemboca em Berlusconi.

Se a anti-política italiana produziu Berlusconi, sua versão tupiniquim foi capaz de conceber algo mais próximo da Itália dos anos 1930-40.

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A estratégia de Steve Bannon impediu qualquer tipo de aproximação entre Globo e Bolsonaro. O ideólogo americano tem como praxe criticar a grande mídia para engajar pessoas em suas próprias plataformas, domesticadas para atender a seus interesses.

Saber se, na ausência de Bannon, Globo e Bolsonaro poderiam se unir, com Supremo e com tudo, é um exercício impossível. Bolsonaro provavelmente não ganharia sem Steve Bannon; e Roberto Irineu Marinho provavelmente não embarcaria de cabeça num projeto tão anti-civilizatório.

Globo e Bolsonaro não têm perdão.

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Bolsonaro não homenageou João Gilberto em sua morte. Talvez por preguiça de desemporcalhar o corpo e a alma. Dissera apenas que João era “uma pessoa conhecida, tá ok”. A Rede Globo, no entanto, tratou de botar uma programação quase exaustiva de exaltação ao modernizador da música brasileira.

A ideia de aliança parece melhor quando temos João Gilberto em comum. Então, para nos restabelecermos, também ouçamos o mesmo João. Ou então a dor deles também será a nossa.

E sem perdão.

  1. Sobre a globo é indispensável a leitura de “O quarto poder uma outra história” de Paulo Henrique Amorim. O plano dela é o mesmo da eleição que deu vitória a Collor, derrotou Brizola e levou Lula ao 2° turno para perder. Em 2022 levará o pt ao 2° turno para perder de Moro. (O juiz que trabalha pros ianques).
    Sem contar que Lula e Dilma foram os que mais deram dinheiro (via publicidade) a globo.
    Bolsonaro se tornou adversário no momento em que priorizou outras emissoras do PIG. E ainda tirou o monopólio do futebol (logo o flamengo) da emissora dos marinhos.

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