JONES MANOEL: Do “Ouro de Moscou” ao “Vai para Cuba”

Do "Ouro de Moscou" ao "Vai para Cuba". luis carlos prestes
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Depois da Revolução Russa de 1917, passa a fazer sucesso mundial um documento famoso, mas hoje esquecido: “Os Protocolos dos Sábios de Sião”. Esse documento, totalmente antissemita, colocava os judeus como agentes globais de um projeto de poder total e mundial, infiltrados em todos os países do mundo com intenção de garantir o fim dos “valores ocidentais e cristãos”. Divulgado de forma entusiasmada por figuras como Henry Ford e Winston Churchill, “Os Protocolos” fornecem um modelo básico de propaganda anticomunista: os judeus, assim como os comunistas, nunca são membros do “corpo nacional”, mas agentes estrangeiros, antinacionais, atuando para subverter a pátria – não custa lembrar que era moda ler a Revolução Russa como uma conspiração judaico-bolchevique.

A partir de então, em todos os países do mundo, os comunistas eram tratados como “agentes estrangeiros” a serviço de Moscou. Todo militante comunista era considerado um espião em potencial para aplicar a “política soviética” no seu país e colocá-lo sobre o controle do partido judaico-comunista ou negroide-comunista.

O Partido Comunista dos EUA enfrentou várias tentativas de colocá-lo na ilegalidade com base nesse argumento: o partido seria antiamericano e a serviço da Rússia. No Brasil, em março de 1946, o Deputado Barreto Pinto, do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), encaminha denúncia ao Tribunal Superior Eleitoral contra o PCB, alegando o caráter ditatorial e internacionalista da agremiação e pedindo a cassação de seu registro. Além disso, acusava-se a agremiação política de estar a serviço da União Soviética e que, em caso de guerra, seus militantes lutariam contra o Brasil.

Com algumas variações, não importa o país, o discurso era sempre o mesmo: comunistas são um corpo estranho, uma espécie de vírus ou câncer, a corroer o tecido nacional a serviço de uma potência estrangeira. O carrasco assassino de comunistas e anarquistas do varguismo, Filinto Müller, e o carrasco mais notório da ditadura empresarial-militar, Carlos Alberto Brilhante Ustra, tinham exatamente o MESMO DISCURSO quando tratavam de figuras históricas do movimento comunista como Luís Carlos Prestes e Carlos Marighella: agentes da União Soviética para subverter a política brasileira.

A síntese desse discurso anticomunista era a lenda do “Ouro de Moscou”. A ideia de que a URSS financiava regiamente os partidos comunistas pelo mundo – discurso replicado, inclusive, por intelectuais, como Alberto Guerreiro Ramos, ainda que com mais refinamento.

O tempo passou. A lógica do “Vai para Cuba” hoje é exatamente a mesma dos tempos do “Ouro de Moscou”. A compreensão de que a esquerda – nesse caso é bem mais amplo que os comunistas – não são brasileiros, parte da nacionalidade, mas seres a serviço de um projeto outro que não o “nosso”, inimigos da pátria, servos de outra “potência” estrangeira que quer difundir seus valores no Brasil.

E não preciso dizer que quem repete esse discurso, seja para o passado ou o presente, flertar com o mais vulgar e reacionário anticomunismo.