NELSON MARCONI: É possível gerar 2 milhões de empregos no primeiro ano de governo?

Ciro Gomes
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É possível gerar 2 milhões de empregos no primeiro ano de governo, como prevê o plano de governo de Ciro Gomes?

Sim, é possível, pelos motivos explicados a seguir, em nota que escrevi com Guilherme Riccioppo Magacho e Igor Rocha. O Brasil investe muito pouco em infraestrutura. O investimento brasileiro nesse setor chegou a ser 2,4% do PIB no início desta década, mas desde então vem caindo. Enquanto a Índia, o Chile e a Colômbia investem cerca de 5% do PIB em infraestrutura, o Brasil investiu apenas 1,7% do PIB em 2017. Esses dados são alarmantes, pois o Brasil nem sequer investe para cobrir a depreciação das estradas, ferrovias, portos, rede de energia, de telecomunicação e saneamento que tem hoje. Segundo estimativa da ABDIB, seria necessário investir 5% do PIB para repor o capital depreciado e modernizar nossa infraestrutura.

Em termos monetários, o investimento em infraestrutura representou R$ 110,4 bilhões em 2017 e deve se manter nesse patamar em 2018. Para o próximo ano, porém, é possível aumentar significativamente esse montante. Em termos de projetos, não faltará demanda por recursos públicos. Há um grande número de obras paradas que, somadas, totalizam R$ 61,3 bilhões. Supondo que apenas metade dessas obras paradas sejam retomadas, já serão injetados mais de R$ 30 bilhões no setor da construção.

Adicionalmente, há uma série de novos projetos que devem ser colocados em prática o quanto antes. Na medida em que as obras paradas sejam retomadas, não será difícil supor que mais R$ 20 bilhões de investimento possam ser realizados, com especial destaque para investimentos em saneamento e com a retomada do Minha Casa Minha Vida. Somados aos R$ 30 bilhões referentes às obras que estão paradas, serão injetados R$ 50 bilhões a mais no setor da construção. Embora esse valor pareça muito alto, o que se alcançará é apenas o retorno do nível de investimento em infraestrutura ao patamar de 2014, ano em que chegou a 2,4% do PIB.

Para cada um bilhão de reais investidos em infraestrutura, estima-se, com base em dados do IBGE, que sejam gerados mais de 20 mil empregos no setor e em sua cadeia. Cerca de metade desses empregos é gerada no próprio setor da construção, enquanto outra metade é gerada na cadeia produtiva do setor, como em máquinas, equipamentos, materiais de construção, serviços de engenharia e em diversos outros elos. Estima-se, com isso, que os R$ 50 bilhões a mais na economia gerarão aproximadamente 1 milhão de empregos no setor da construção e na sua cadeia.

Essa estimativa não considera que a geração de empregos é também capaz de aumentar a renda dos trabalhadores e essa renda retorna para a economia na forma de consumo; é preciso considerar que esses empregos gerados vão estimular outros setores, como a indústria de alimentos, de eletrodomésticos, o comércio e os serviços e, portanto, é uma estimativa conservadora.

Mas será possível elevar o investimento nessa magnitude no próximo ano? Certamente que sim. Queremos, na verdade, que o investimento público e privado em infraestrutura – que não competem, mas são complementares – atinjam R$ 300 bilhões (aproximadamente 5% do PIB, valor tido como necessário para a infraestrutura, conforme citado mais acima). Pelo lado dos projetos está muito claro que há demanda para o investimento, mas temos recursos suficientes para isso? Sim, mas é preciso busca-los em várias fontes.

O BNDES tem potencial para ampliar seus investimentos em mais R$ 90 bilhões, chegando a R$ 150 bilhões em 2019. Claro que nem todo esse recurso vai para infraestrutura, mas grande parte pode cumprir essa função. Adicionalmente, o Banco do Brasil tem a possibilidade de ampliar seus financiamentos em R$ 50 bilhões; a Caixa, que financia principalmente saneamento e habitação, em mais R$ 30 bilhões; recursos de Eximbanks de diversos países somam pelo menos R$ 20 bilhões disponíveis para investimentos em infraestrutura; também podemos captar junto às organizações multilaterais, como BID e Banco Mundial, mais 15 bilhões e, na medida em que a economia retomar sua atividade, os fundos de Private Equity facilmente poderão complementar esse financiamento com mais R$ 20 bilhões. Por fim, é importante considerar que o próprio Estado pode recuperar sua capacidade de investir por meio de medidas estratégicas. A securitização da dívida das empresas com a União, por exemplo, pode gerar mais R$ 30 bilhões por ano para que o Estado possa investir. Em suma, a questão do financiamento para o investimento não é um problema caso a estratégia de investimento esteja clara e o Estado saiba utilizar adequadamente suas instituições.

Além da criação de um milhão de empregos devido à retomada dos investimentos em infraestrutura e construção residencial, há um grande potencial de geração de empregos em cadeias exportadoras. Com a taxa de câmbio em um patamar competitivo, o estabelecimento de políticas que possibilitem ao setor produtivo aumentar sua competitividade, a melhoria da infraestrutura e a redução dos custos financeiros, a indústria brasileira vai retomar sua capacidade de exportar. Se as exportações aumentarem de 12,6% para 13% do PIB, portanto uma elevação modesta, estimamos que serão gerados novos 740 mil empregos.

A retomada do consumo, impulsionada em grande medida por políticas que reduzam o endividamento das pessoas, também será um grande impulsionador do emprego. Devido aos efeitos diretos e indiretos sobre o consumo das famílias não é difícil supor que serão geradas mais 400 mil vagas de trabalho, totalizando assim mais de 2 milhões de novos empregos em 2019. Tudo isso sem considerar os impactos derivados desse aumento do emprego sobre a renda e o consumo em um segundo momento.

Desta forma, com base nessa estratégia, é factível gerar 2 milhões de empregos em 2019. A economia brasileira já registrou números até maiores em anos anteriores. Para tal, é preciso, primeiro, priorizar essa meta, ao contrário do que faz o governo atual. A recuperação do emprego será fundamental para a melhoria dos indicadores econômicas e sociais do país, visto que atualmente são quase 13 milhões de brasileiros desempregados.

Por Nelson Marconi.