O próximo passo do neoliberalismo

O próximo passo do neoliberalismo
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Como é sabido por todos que estudam a política brasileira e latino-americana, o sistema neoliberal não é personalista. Para ele, não importa quem seja o governante quem aplique esse projeto, desde que a agenda seja seguida à risca.

Obviamente, no caso do Brasil, Bolsonaro não era o plano A desta agenda, mas foi a forma que o sistema encontrou de penetrar no Palácio da Alvorada. O liberalismo tem como premissa pregar apreço à democracia e pautas de minorias, pois o sistema não tem ideologia ou moralidades pré-definidas senão seguir as leis do mercado de capitais. No caso de nosso país, ele precisou fazer um contorcionismo pra se adaptar ao conservadorismo do nosso povo. “Sou liberal na economia e conservador nos costumes”, dizia o ex-candidato à presidência da República do partido Novo, João Amoedo. No Frigir dos ovos, Bolsonaro não era o candidato dos sonhos do mercado, mas a dobradinha com Paulo Guedes parecia ser um “o que tem pra hoje” interessante para o sistema.

Após pouco mais 4 anos de regime neoliberal implantado no país (não esqueçamos que tudo começou no segundo governo Dilma com a indicação de Joaquim Levy para cuidar do extinto Ministério da Fazenda), e após aplicar todas as reformas que os liberais clamavam essenciais para tomar o rumo do crescimento, a economia do país está cada hora mais acelerada em direção ao abismo.

Já tem algum tempo que o governo tenta mascarar o desemprego usando pessoas que realizam atividades sub-humanas como ocupadas. O Uber que você toma, a tia que vende trupas e bolos de potes, a diarista de aplicativos são todos empregados pra esse governo. Está muito próximo o dia em que o Uber não terá para quem dirigir e a diarista não terá a casa de ninguém para limpar, pois a camada imediatamente acima na sociedade do que essas citadas será a próxima a ser atingida pelo neoliberalismo.

Nesta segunda-feira, a “mão invisível do mercado” tentou puxar o freio de mão do carro que se precipitava em direção ao abismo com o tal “circuit breaker”, enquanto o governo torrava nossa já escassa reserva cambial para tentar conter a alta do dólar. Nada disso se mostrou efetivo, pois a bolsa fechou o dia 9/3/2020 com queda de mais de 12% e o dólar no recorde histórico (mais um) de R$ 4,73.

Esgotada toda a sorte de malabarismo retóricos dos neoliberais só sobrará a eles descartar o atual presidente colocar na conta de seus rampantes e falta de civilização o fracasso de uma agenda que, mesmo seguindo sua agenda à risca, não obteve êxito na alavancagem da economia. Em breve irão aparecer com um discurso democrata e conciliador fritando o atual presidente e colocando um novo salvador da pátria no lugar. Seria esse alguém João Doria? Pela vontade do mercado sim, mas não vejo carisma nesse sujeito – comprovadamente mentiroso – para assumir esse papel. Luciano Huck parece muito à frente nessa empreitada.

Seja quem for o próximo escolhido para levar o estandarte do liberalismo, nós, que estamos do outro lado desse tabuleiro de xadrez, não temos dificuldade pra adivinhar a próxima jogada do mercado. Temos exemplos aqui nos nossos vizinhos argentinos argumentos como “Macri não foi liberal o bastante”!

Sábado estava num bar com uma amiga tentando convencer um garçom neoliberal de que o “estado mínimo” que ele tanto defendia só iria enterrá-lo ainda mais na sua condição de precariedade. Não sei o que tem de tão fascinante do sistema neoliberal para encantar as classes mais baixas… talvez a venda da ilusão de que oprimido possa assumir o lugar do opressor se se esforçar o suficiente, tese que já foi refutada pelo brilhante Noah Chomsky no seu Réquiem para o sonho americano, documentário em que mostra que mesmo nos EUA o sonho americano está morto, pois 98% dos estadunidenses nascem e morrem na mesma classe social (os outros 2% podem subir ou descer na escala socioeconômica).

Enfim, querem vender na América Latina uma ciência que não deu certo em lugar algum do mundo e não é usada nem mesmo nos países considerados berços do capitalismo. Vale lembrar que no crash de 1929, os EUA só saíram da crise graças ao New Deal, ideia do brilhante John Maynard Keynes, que consistia em aumentar os salários do povo – mesmo em meio a uma crise sem precedentes – para alavancar o poder de consumo, o que geraria um ciclo virtuoso da economia, que afetaria o comercio, a indústria a extração de matéria-prima e a economia de modo geral.

Quase um século depois, em um país que está cada vez mais dependente de matérias-primas brutas, estas reguladas por um mercado internacional controlado por superpotências, estamos remando na direção oposta daquela que pregava o plano exitoso de Lord Keynes. Enfim, camaradas, nossa esperança é que esse remédio amargo dos neoliberais abram os olhos do nosso povo, assim como aconteceu com nossos irmãos argentinos e chilenos.

Por Rhodner Paiva