Oposição: hora de amadurecer, ou, se não sabe brincar, não desce pro play

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Nessas primeiras três semanas de governo Bolsonaro temos assistido um bater de cabeças inédito por parte daqueles que foram escolhidos para governar o Brasil.

Os grupos de sustentação do novo governo demonstram contradições significativas entre si e, excetuando o que podemos definir como núcleo militar, não sabem exatamente o que fazer.

Fica demonstrado que o período de transição de nada adiantou para que conhecessem minimamente a máquina pública e como geri-la.

Num momento como esse a oposição tem um papel ainda mais importante do que teve em inícios de outros governos, mas nem todos os atores dessa oposição parecem ter clareza de sua responsabilidade.

O desgaste inicial causado pela postura errática ou mesmo esdrúxula do novo governo, além do caso envolvendo o senador eleito, Flávio Bolsonaro, devem trazer uma natural perda de apoio popular ao governo (ainda não medido pelos institutos de pesquisa) mas nos causam, também, alguma perplexidade em ver como algumas figuras importantes da oposição atuam diante desses acontecimentos.

A direção do PT continua com sua narrativa própria de interpretar os fatos sem nenhuma coerência ou compromisso com a realidade, ao sabor dos seus interesses de momento.

Ora a Rede Globo é a encarnação do mal, ora – principalmente agora que os donos da emissora parecem medir forças com Bolsonaro – é uma fonte acima de qualquer suspeita. Daqui um pouco corremos o risco de assistirmos uma palavra de ordem tipo “Bonner, guerreiro do povo brasileiro” vindo das hostes petistas.

Não podemos, por óbvio, nos deixar entorpecer por essa guerra entre as Organizações Globo e o governo Bolsonaro. Nenhum dos dois está a favor dos interesses do Brasil ou do povo brasileiro.

O mesmo ocorre, de acordo com essa ótica petista toda própria de ver o mundo a sua volta, em relação a ministros do STF (caso de Gilmar Mendes, por exemplo, ora o próprio diabo em pessoa, ora um santo libertador do Lula), com o MP, Forças Armadas e, o pior de tudo para um partido político, com lideranças e parlamentares de outros partidos.

Esse tipo de condução errática muito se assemelha à do novo governo. As posturas sectárias e um culto quase sebastianista em relação aos seus respectivos – e comprovadamente limitados – líderes também os une.

É um erro apostar que o desgaste do governo Bolsonaro implique, automaticamente, na redenção do PT ou da esquerda.

Não sem o campo popular atuar politicamente com responsabilidade, de forma propositiva, passando sempre sinceridade e coerência para o povo brasileiro, coisa que, ao que parece, o PT não sabe fazer.

Pseudo espertezas estão muito distantes de se constituírem posturas inteligentes.

Tenho ouvido e lido muitos comemorando que o eleitor vai acabar descobrindo logo, logo que “votou errado”. Não vai porque não votou. Explico. Grande parte dos 57 milhões de votos em Bolsonaro no segundo turno foi no sentido de se votar em “qualquer um, menos no PT”. Logo o “qualquer um” quer dizer isso mesmo: qualquer um. Portanto, para esse eleitor, por pior que seja o governo Bolsonaro, ele não votou errado. Preferiu dar uma chance para algo diferente do PT, mesmo sem saber exatamente o que esperar disso, de forma consciente e legítima.

Voltando ao amadurecimento que se faz necessário, agora, num momento de suma importância para a delimitação dos espaços que a oposição poderá ocupar no Congresso, com as eleições das mesas diretoras, assistimos a cantilena infantil de que “não compomos bloco com o PSL”. Ora, essa afirmação, por si só, é mentirosa. Em momento algum existe ou existiu qualquer possibilidade da formação de um bloco dos partidos de oposição com o PSL e a direção do PT sabe muito bem disso !

O que ocorre – como ocorreu em diversas eleições de mesa diretora anteriormente, com participação direta do PT em composições com o PSDB, Dem, PMDB, etc – é o estabelecimento negociado das forças representadas no parlamento para preenchimento dos espaços onde vai se desenvolver sua atuação na Câmara e no Senado durante a próxima legislatura.

A eleição do Eduardo Cunha foi a primeira, desde 2003, onde o PT abriu mão de compor espaços e resolveu bater chapa. Cunha se elegeu com folgas no primeiro turno, enquanto o candidato do PT, Arlindo Chinaglia, teve pouco mais de 130 votos, deixando o partido sem postos de comando capazes de influir na pauta de comissões importantes, dando de bandeja o rolo compressor para as forças então na oposição. Isso com o governo federal tendo muitos ministérios nas mãos dos vários partidos que votaram em massa no Eduardo Cunha.

Agora essa correlação de forças é muito pior para o campo popular.

Todo mundo sabe o que aconteceu a partir desse erro crucial na estratégia petista.

De lá pra cá, desafio alguém a mostrar um único acerto de decisão estratégica tomada pelo comando petista.

Não vão encontrar.

Mas como reconhecer erro é tabu ou sacrilégio para os mais fanáticos (claro que existem vozes lúcidas dentro do PT, como os governadores do Ceará, Bahia e Piauí ou o senador eleito Jacques Wagner, mas estes, infelizmente, não falam pela direção nacional do PT) continuam insistindo nos erros, como se tudo que aconteceu desde 2014 se devesse exclusivamente a fatores externos, conspirações, traições, sem nenhuma responsabilidade nisso do comando petista.

É um caso único de estado-maior que perde batalhas em série, perde a própria guerra, mas continua prestigiado pelo rei e é mantido no comando.

Não pode a oposição mais responsável ao governo Bolsonaro ficar refém dessas idiossincrasias, evidentemente.

Quanto a candidatura de Marcelo Freixo a presidência da Câmara ela é, por si só, a maior demonstração da necessidade de se atuar no parlamento de forma realista.

Não vou nem entrar no mérito da inviabilidade da candidatura de um deputado federal de primeiro mandato, duma bancada praticamente isolada de 10 deputados e que teve como candidato a presidente da república o Guilherme Boulos, que, apesar de ser enaltecido pela blogosfera petista como um “vencedor” e como um candidato que “saiu muito maior da disputa”, teve bem menos da metade da votação do Cabo Daciolo.

Freixo é, ele próprio, o maior exemplo da importância de ocupar espaços no legislativo através de composições pragmáticas.

Eleito como único deputado do PSOL, com pouco mais de 13 mil votos em seu primeiro mandato, Freixo logo tratou de estabelecer uma relação de composição muito próxima (a ponto de dividir autoria em dezenas de projetos de lei) com o então todo poderoso presidente da Alerj, Jorge Picciani.

Foi Picciani quem bancou Marcelo Freixo como presidente da Comissão de Direitos Humanos da Alerj (é presidente até hoje, sempre em acordo com Picciani e o PMDB/RJ), assim como na CPI das Milícias, mesmo o PSOL não tendo bancada para ocupar tais espaços.

Agora ter a pretensão de constranger as forças de oposição ao governo Bolsonaro na Câmara como se um apoio à sua aventura (já que não ver ter um Jorge Picciani pra chamar de seu na Câmara dos Deputados) fosse um delimitador para quem é ou não oposição de esquerda pra valer é infantilmente ridículo.

É exatamente esse tipo de oposição, representada pelo PSOL e por setores do PT, que sonha o governo Bolsonaro.

Não à toa a deputada eleita Joice Hasselmann já deixou claro em entrevista recente as figuras em cima das quais a bancada do PSL vai fazer “marcação cerrada” na Câmara: Freixo, Jean Willys, Gleisi Hoffmann, Maria do Rosário.

Escolher seus adversários está muito longe de demonstrar que as forças que elegeram e apóiam Bolsonaro não tem estratégia (essa visão míope de subestimar quem ganhou a eleição de goleada já era pra ter desaparecido, mas parece que a cada derrapada do governo – e são muitas – volta com força na direção do PT).

E essa escolha se deve ao fato de que o PSOL e setores do PT entregam aos apoiadores do Bolsonaro exatamente o terreno onde pretendem travar as maiores discussões: pautas identitárias, de costumes, etc.

Em detrimento, claro, de discussões sobre economia, emprego, soberania nacional.

E também não é por acaso que a Globo nesses pontos se alia ao PSOL/PT e na economia ao Paulo Guedes.

O que a Globo parece estar gestando – com o sempre disponível auxílio luxuoso do PT e do PSOL nesse objetivo, já que se prestam ao papel de atacar e tentar dividir o bloco do PDT, PC do B, PSB e Rede – é a construção de uma oposição ao governo Bolsonaro de perfil de direita mais liberal, onde o interesse nacional e os direitos do povo brasileiro ficam vendidos igual estão agora, mas com uma cara mais parecida com o politicamente correto, mais ao agrado do Partido Democrata americano, numa tentativa de substituição da aliança entre Bolsonaro e Trump, extrema direita do Partido Republicano.

Fica a dica pra oposição que pretendem fazer o PSOL e o PT: se não sabem brincar, não desçam pro play, pois o brinquedo em questão é o destino do nosso país e do povo brasileiro.