Os pitis do general Heleno

General Augusto Heleno
Botão Siga o Disparada no Google News

12 de outubro de 1977 foi um dia decisivo para a consolidação da abertura política que poria fim a ditadura no Brasil.

Naquela distante quarta-feira, feriado nacional em comemoração ao dia de Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil, o então presidente Ernesto Geisel demitiu ainda pela manhã o ministro do exército, Sylvio Frota, expoente mais destacado da linha dura do regime militar e uma espécie de precursor do pensamento de Olavo de Carvalho.

Frota era radicalmente contra a volta da democracia, o restabelecimento de relações diplomáticas com a China e denunciava uma suposta infiltração comunista no próprio governo Geisel, que definia como de centro-esquerda. Também defendia o estado mínimo e era ultraliberal na economia.

Ídolo dos torturadores do regime militar, se tornou o nome preferido dos porões para a sucessão de Geisel. E foi essa pretensão de ser candidato e tentar emparedar o presidente que causou sua demissão sumária.

Os jornais da época relatam que a transmissão do cargo para seu sucessor, general Fernando Bethlem, durou menos de 2 minutos.

Nos dias seguintes Geisel e Bethlem trataram de exonerar todos os oficiais que eram diretamente ligados a Sylvio Frota, retirando-os rapidamente de Brasília e do QG do Exército.

Dentre esses oficiais estava o ajudante de ordens, portanto dos mais próximos auxiliares do general Sylvio Frota, o então capitão Augusto Heleno Ribeiro Pereira.

Esse mesmo que hoje é ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional de Jair Bolsonaro e que, às vezes, demonstra ter a pretensão de ser uma espécie de tutor da nação.

Para muitos o general Heleno seria uma ilha de bom senso e equilíbrio em meio a um governo de aloprados.

Os que pensavam assim certamente se surpreenderam com os seguidos pitis do ministro nos últimos dias, coincidentemente desde que o site The Intercept Brasil iniciou a divulgação dos conteúdos da vaza-jato.

O primeiro piti registrado do ministro Augusto Heleno foi o soco na mesa e o descontrole demonstrado no café do presidente com jornalistas, quando saiu do sério ao falar da facada de Juiz de Fora e do pecado “antipatriotico” que é fazer qualquer questionamento a respeito.

Depois o “azar” que deu quando um sargento da aeronáutica foi preso por autoridades espanholas, com nada menos que 39 kg de cocaína, num avião da presidência da república, depois de sair da Base Aérea de Brasília e passar por todo o aparato de inteligência do Gabinete de Segurança Institucional sem ser incomodado.

Sua entrevista a respeito foi um vexame internacional sem precedentes.

Talvez com medo de ter queimado seu filme com Bolsonaro – que demitiu 2 generais de ministérios – e tentando melhorar sua barra, o ministro do GSI foi ao ato em apoio a Sérgio Moro em Brasília e fez um discurso pateticamente radical, digno de um discípulo de Olavo de Carvalho e da memória de Sylvio Frota, pois desprovido de nexo com a realidade, mas raivoso e com muito viés ideológico.

Cabe ressaltar que nem mesmo os risíveis ministros da educação e do meio-ambiente desceram ao ridículo de participarem dessas mobilizações.

O general Augusto Heleno foi o ÚNICO ministro de Bolsonaro de corpo presente no evento.

Para quem tinha a esperança de que os generais do governo enquadrassem Olavo de Carvalho e limitassem os efeitos de suas maluquices fica a triste certeza que o mais destacado desses generais, o que se supunha ter a maior ascensão sobre Bolsonaro, é, ele próprio, um expoente da olavização do núcleo militar do governo.

E nem isso aparentemente foi suficiente para atenuar sua situação, já que no dia seguinte o vereador Carlos Bolsonaro, colocou sob suspeita no caso do sargento traficante o próprio GSI e, consequentemente, seu ministro-chefe.

Além de se habituar a passar por essas humilhações vindas diretamente da família do rei o general Heleno vai ter que se acostumar a ser cobrado por sua decisiva participação no processo que resultou nessa mistura sobre o que são as Forças Armadas e o que é o Governo Bolsonaro.

Essa cobrança vai vir da história e dos oficiais da ativa, quando estes se derem conta (se é que já não se deram) do erro que é esse entrelaçamento sem limites.

A irresponsabilidade de misturar para muito além de qualquer parâmetro aceitável uma instituição de Estado (portanto permanente) com um governo (transitório) vai estar sempre na conta do general Augusto Heleno, que emprestou o prestígio que possuía junto às Forças Armadas para que, no fim, elas próprias se vissem atreladas de forma muito perigosa ao governo do qual ele é (ainda) ministro.

Na medida que o governo se desgasta a boa imagem que as Forças Armadas possuem junto a população brasileira só tende a ser arrastada junto.

O final dessa história dificilmente vai terminar bem.