PT e PSDB juntos na presidência da ALESP

PT e PSDB juntos na presidência da ALESP petucanismo
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Tem muita gente por aí se arrogando o direito de distribuir carteirinha de esquerda. Mas o fato é que o jogo parlamentar tem suas próprias regras, gostando ou não. O PT caminha para reiterar sua aliança com João Dória na Assembleia Legislativa de São Paulo, a fim de evitar que algum deputado do PSL ou outro aliado do Planalto ocupe a presidência da Casa.

O petucanismo foi o sistema de polarização entre PT e PSDB que organizou a política brasileira depois da redemocratização. Apesar de muitas concordâncias fundamentais, como a manutenção do tripé macroeconômico e não reversão das privatizações, os dois partidos faziam oposição um ao outro, inclusive com divergências programáticas, como a política externa.

O petucanismo também é marcado por aproximações entre ambos os partidos. Um exemplo clássico é a figura de Francisco Weffort, partilhada tanto por PT como PSDB, que estrutura a ideologia das duas agremiações em torno do combate ao mal do “populismo”.

O ano de 2021 parece indicar uma nova etapa do petucanismo. Desde o golpe de 2016 e o fiasco em sua resistência, sabemos da decadência do PT e como ele se agarra a fragmentação identitária e a manutenção de uma política econômica neoliberal para agressivamente manter sua hegemonia sobre a esquerda e com isso sobreviver institucionalmente. Mas também o PSDB foi devorado pelas forças fáusticas que ele mesmo ajudou a libertar com seu desavergonhado udenismo.

O estado de São Paulo, conhecido para os íntimos como Tucanistão pelas décadas de controle político por parte dos tucanos, já não é mais o mesmo. Em sua luta contra o PT, ainda em tempos de petucanismo, o PSDB foi se aproximando de tendências que são muito distantes de suas raízes “modernizadoras”. A despeito do discurso racista contra o “coronelismo” do nordeste, a verdade é que a política paulista sempre foi dominada por uma variante particular de populismo vigente nas terras bandeirantes. Ademar de Barros, Jânio Quadros e Paulo Maluf são apenas alguns nomes que marcaram esse populismo tipicamente paulista. O PT, que também nasceu da crítica ao populismo, uma vez na presidência, teve de se curvar ao menos parcialmente às suas raízes latino-americanas e abraçar o carisma de Lula – ainda que esta força tenha sido malversada na manutenção do status quo neoliberal. Igualmente, o PSDB teve de se aproximar de personagens próximos à demagogia penal para não perder sua hegemonia sobre a oposição aos petistas durante os anos 00 e 10.

Foi assim que a imagem de policiais militares fardados como parlamentares e secretários começaram a pipocar na política nacional. Não que a presença de militares na política seja um problema; lembremos da memória do Marechal Lott, herói do Brasil. O problema foi o processo de cooptação neoliberal e de histeria policialesca em defesa de robocops com licença para matar circulando nas ruas sedentos de sangue. Por trás desse movimento, a sempre presente figura do sócio oculto imperialista, buscando reduzir o Estado brasileiro a uma milícia colonial e extrator de mais-valor para os fundos financeiros do primeiro mundo.

É nesse contexto que a Lava-Jato atinge como um relâmpago em meio ao esgotamento do petucanismo. Políticos clássicos do Tucanistão caíram em suas garras, como Geraldo Alckmin e José Serra, apesar de tantos anos de serviços prestados ao imperialismo. O núcleo duro do PSDB é implodido e acaba capturado pela mais abjeta fração financista da burguesia paulista. Estamos falando do LIDE e de sua cafonice de sapatênis.

Encabeçado pela breguice sem limites de João Dória, essa fração procura exercer o poder diretamente na crise de hegemonia aberta pelo golpe de 2016, completado pela destruição da autoridade central em 2018 (Bolsonaro é mais o vazio de poder do que o exercício dele) e catalisado pelo coronavirus em 2020. A disputa pela vacina, além de atestar a completa ruína do Brasil, tem por pano de fundo a luta pelo Brasil pós-pandemia.

Na ALESP, o PT tem a segunda maior bancada com 10 deputados estaduais. Em primeiro lugar, o PSL fez 15 deputados. PSDB tem 8 parlamentares, enquanto o DEM tem 7 cadeiras de um total de 94. PT, PSDB e DEM indicaram que formaram um bloco para garantir a eleição de Carlos Pignatari para a presidência da ALESP, em troca da secretarias para os petistas e para Milton Leite Filho do DEM, príncipe herdeiro da miltonlândia, região da zona sul da capital paulistana dominada por seu pai.

A razão da aliança é evitar que o bolsonarismo controle a presidência da ALESP. Foi assim em 2019 que o PT se aproximou de Doria para desidratar a campanha de Janaína Paschoal, no contexto de ascensão de Bolsonaro e de sua alta popularidade. Esta ameaça não desapareceu. Embora o bolsonarismo tenha sofrido muitas defecções (a começar pela Lava Jato), seu diálogo com o centrão e a lufada de popularidade do auxílio emergencial podem lhe garantir uma sobrevivência até 2022.

Não é um cálculo simples. O controle da ALESP pelo grupo de Doria pode garantir privatizações como da SABESP ou do Metro, estatais estaduais que se encontram na mira da sanha de Henrique Meirelles e centrais para um Projeto Nacional de Desenvolvimento. Também pavimenta o caminho para reformas administrativas com ainda maior precarização dos serviços públicos de São Paulo. E ainda consolida o poder de Doria, qualificando ainda mais como sucessor do bolsonarismo. Um herdeiro muito mais temerário do que o ex-militar, já que possui profunda capilaridade em um amplo setor da burguesia.

A coisa é tão escabrosa que foi de Coronel Telhada (PP) que a Folha colheu a melhor citação de oposição ao blocão de Doria: “Não tenho pretensão de ser presidente, mas vários deputados vieram conversar comigo. Em fevereiro, se os deputados mostrarem que estão comigo e que eu tenho condições de concorrer, estou disposto a atender e fazer campanha, mas não vou distribuir benesses e cargos. Com um presidente do PSDB há uma submissão da Casa ao governo, o que é muito ruim. E acabam acontecendo desastres como o PL 529 [projeto de ajuste fiscal], a reforma da previdência, extinção de empresas. A Assembleia deve ter independência e total autonomia”

A despeito da denúncia que continuamente fazemos do neoliberalismo petista e de seus vassalos, não adianta encarar a sucessão da presidência ALESP com imediatismo moralista – embora o próprio PT o faça publicamente para acusar outras forças de esquerda. O fato é que em São Paulo qualquer partido de esquerda encontra-se entre a frigideira e o fogo. De um lado, o bolsonarismo e sua destruição do Brasil; do outro o projeto neoliberal de colonização ainda mais profunda do país. O que partidecos como o PSOL tem a oferecer é somente uma oposição estética em pautas identitárias e lançando candidaturas que eles sabem que serão rapidamente derrotadas. O objetivo é a manutenção da aparência de oposição, que lhe garantem votos da classe média ilustrada de São Paulo, inchada pela alta renda do Estado. É a disputa por essas migalhas de votos que precipita a esquerda na dança da morte que a isola do grosso do eleitorado brasileiro.

Qualquer grupo paulista interessado na luta popular precisa reconhecer que São Paulo é a ponta de lança do imperialismo no Brasil. Portanto, o núcleo de sua estratégia deve ser buscar aliados no Brasil Profundo, em oposição aos “modernizadores” neoliberais sudestinos, tanto em sua variante “de esquerda” como abertamente reacionária.

Pensar o Brasil estrategicamente é ir além das aparências imediatistas que tanto abundam na esquerda. É penetrar o véu da complexa realidade brasileira, encarando a luta de classes no espaço de um país dependente. E não ficar distribuindo carteirinha de esquerda ou direita.

PT e PSDB juntos na presidência da ALESP

  1. Apenas uma informação complementar. A aliança PT-PSDB na ALESP já dura pelo menos uma década inteira. O PSDB fica com a Presidência da ALESP, controlando a pauta e o ritmo das votações de acordo com as vontades do poder executivo. O PT fica com a Primeira Secretaria, que lhe garante apenas alguns cargos de livre provimento (uns 80 mais ou menos), que servem para acomodar vários ex-deputados que não ganharam eleições. Não me parece ter nada de estratégico nessa aliança. E por que o PSDB insiste em manter o PT como primeira secretaria? Poderia fazer aliança com qualquer outro partido. Mas colocar a suposta oposição na primeira secretaria, com tantos cargos, é uma forma de cooptação. O PT na ALESP convive eternamente com a ameaça de, se fizer oposição para valer, perder a boquinha na próxima eleição da Mesa. Por isso que não fazem oposição a projetos destrutivos como a Reforma Administrativa aprovada em 2020 por Cauê Macris (PSDB) ou mesmo na oposição ao Orçamento, apenas fingem ser oposição.
    Ante a devastação neoliberal de João Dória/PSDB e o bolsonarismo conservador e neoliberal de Jair Bolsonaro, é hora da esquerda aliar-se com o povo trabalhador.

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