Sobre a violação da frente ampla encoberta com gritos de amplitude

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Palavra de ordem bastante bradada por amplos setores, seja os mais a esquerda e até mesmo entre a direita “moderada”, a frente ampla ou frente única encontra-se no centro do debate, virou “moda”.

Porém, antes da criação deste mecanismo, devemos ter em mente, no mínimo, os seguintes questionamentos: quais organizações e setores comporão a frente? Qual a finalidade? E quais resultados esperar?

No cenário nacional, duas organizações se alçaram a protagonizar frentes amplas: o PT e o PDT. Ambos organizaram-se em torno do impeachment de Bolsonaro, contra o fascismo e por uma unidade nacional.

O PT lidera uma frente composta por PCdoB, PSTU, PCB, PCO, PSOL e UP. Já o PDT, com PSB, PV, REDE e Cidadania. 

Sobre a tática 

A tática é o elemento prático e imediato que norteia, numa situação conjuntural especifica, em base de uma teoria geral, mediata e estratégica, uma organização política. Os elementos principais da tática são seu caráter efêmero, sua viabilidade, seus resultados imediatos e objetivos e, claro, sua amplitude. 

A tática tem por objeto fixar a linha de conduta do proletariado para um período relativamente curto de fluxo ou de refluxo do movimento, de ascenso ou de descenso da revolução; lutar pela aplicação dessa linha, substituindo por novas as velhas formas de luta e de organização, por novas palavras de ordem as velhas palavras de ordem, coordenando estas formas, etc.” ¹ 

O valor da tática encontra-se na sua capacidade de gerar resultados. E, a depender do resultado esperado, condiciona-se sua amplitude. As frentes formadas tem objetivos que não rompem com a ordem burguesa, logo, sua amplitude pode e deve ser maior.

Entre as reservas (que não é a vanguarda) do movimento operário, temos a reserva indireta, ou seja, aquela condição que temporariamente pode contribuir para a tática e para o resultado esperado. No caso das nossas frentes amplas uma se destaca:

“… as contradições e os conflitos entre as classes não proletárias do próprio país, suscetíveis de serem utilizadas pelo proletariado para enfraquecer o adversário e reforçar as suas próprias reservas.” ¹ 

Sobre as frentes 

Ao observarmos a formulação da primeira “frente ampla” (encabeçada pelo PT), tiramos um diagnostico: de ampla ou única só tem o nome.

O impedimento de Bolsonaro exige, dentro das condições dadas (apoio de amplos setores da burguesia, de setores militares e setores da imprensa), a maior amplitude possível. Até porque, para isso se concretizar, necessitaremos do Congresso Nacional e de uma ampla correlação de forças entre os setores proletários e não proletários.

Na verdade, a frente dirigida pelo PT não passa de um conglomerado entre vanguardistas.

Somente com a vanguarda — dizia Lenin— não se pode vencer. Lançar sozinha a vanguarda à batalha decisiva, antes que toda classe, antes que as grandes massas tenham tomado uma posição de apoio direto à vanguarda ou, pelo menos, de benévola neutralidade para com esta… não seria só uma estupidez, mas também um crime.” ²

Vale lembrar que o teor vanguardista, em alguns desses partidos, não passa de estética. O isolamento é claro na própria composição da “unidade”. Dirigir movimentos de massa, sindicatos e associações é o acerto desta frente – isso garante caráter popular, entretanto, para essa caso, é insuficiente. Falta amplitude. Eis o erro da primeira frente.

Já a segunda (encabeçada pelo PDT) acerta na amplitude, na intenção. Aglutinar os amplos setores “democráticos”, mesmo que apenas os democratas formais, atingir com isso amplos setores nacionais, sejam proletários ou não (média e pequena burguesia), é o acerto. E isto se deve a flexibilidade da prática, que não põe, necessariamente, em revelia, os princípios ideológicos.

Contudo, esta frente é vazia. Acena para os amplos setores, mas não os aglutina eficazmente. Isso se deve a falta de inserção nos movimentos de massa e a oscilação e não identificação de classe para si da média e pequena burguesia. Todavia, vale lembrar que essa frente cresce nesses segmentos médios, na aristocracia proletária e apresenta uma estética e programa mais palatável para o “centro”.

Os mais puros irão dizer que não vale a pena explorar esse setor e suas possíveis contradições, mas, “Fazer a guerra — disse Lenin — para derrubar a burguesia internacional, guerra cem vezes mais difícil, mais prolongada e mais complexa do que as mais encarniçadas das guerras habituais entre os Estados, e de antemão renunciar a toda manobra, renunciar ao aproveitamento dos antagonismos de interesses (mesmo temporários) entre os próprios inimigos, renunciar aos acordos e aos compromissos com possíveis aliados (mesmo temporários, pouco firmes, hesitantes, condicionais), não é coisa sumamente ridícula?” ²

Então o que nos resta? 

No plano ideal seria, de fato, a unidade entre essas duas “frentes”. A partir daí poderíamos classifica-lá como tal e aumentar a possibilidade de êxito. Seria deslocar o protagonismo das forças que estão sofrendo rechaço, garantir a aparência ampla e trabalhar, por dentro, na disputa, mesmo que pequena, dos setores mais avançados. Saber lidar com o fluxo e com o refluxo: eis a tarefa de quem deseja resultados.

E isso se justifica principalmente levando em consideração a defesa da democracia, mesmo que formal e burguesa, diante de uma escalada autoritária, do esfacelamento do Estado e do envolvimento direto do presidente e de sua família com o crime organizado.

Lênin sabia relacionar os embates pela democracia com as batalhas por conquistas mais avançadas do proletariado. Dizia ser erro crasso “julgar que a luta pela democracia pode desviar o proletariado da revolução socialista, mascará-la, encobri-la, etc. Pelo contrário, do mesmo modo que o socialismo vitorioso é impossível sem realizar a democracia completa, também o proletariado não se pode preparar para vencer a burguesia sem conduzir uma luta detalhada, consequente e revolucionária pela democracia”. ³

Como em política não podemos ser idealistas, é sabido que essa unidade não sairá. Mas cabe, sobretudo aos que fazem política de forma consequente, apontar os possíveis erros e acertos da tática do nosso campo. E quando ela é vazia de resultados ou apenas colecionamos derrotas, significa que é momento de revermos nossa tática.

… e que atuemos em toda parte e até o fim, guiados pela convicção da necessidade de uma flexibilidade máxima em nossa tática […] Caminhar retilíneo, e unilateralidade, rigidez e ossificação, subjetivismo e cegueira subjetiva – eis as raízes gnosiológicas do idealismo”³, precisava Lenin.

Por Arison Fernandes, diretor da Fundação Leonel Brizola – Alberto Pasqualini em Pernambuco

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¹ https://www.marxists.org/portugues/stalin/1924/leninismo/cap07.htm#tn78
² Esquerdismo, doença infantil do comunismo.
³ https://www.marxists.org/portugues/amazonas/1985/08/congresso.htm